16 de janeiro de 2017

Só soube que tinha poesia
De verdade correndo nas veias
No dia em que percebi
O amor é uma travessura
Que fica muito melhor
Lambuzado de chocolate
E que as madrugadas
Têm a estranha mania
De esconder a vergonha
E as roupas íntimas debaixo da cama
juntamente com os monstros da infância

Réquiem por uma aluna


Nem a tristeza dos amigos
Pode dizer o que não haverá
Pois os olhos não estarão lá
Quando houver beleza e cor
Nem a voz quando música for
Nada faz sentido nesse sentir
A ausência do gesto de carinho
Posto que não há mais pedras
Tão pouco haverá caminho
Com ele as esperanças e glória
Abruptamente interrompidas
Não florirão como deveriam
E a juventude será sempre velha
Porque nunca foi nem irá adiante
Onde está a companheira a amiga
Terá seguido na barca de Caronte
Deixando-nos no cais saudosos
Foi para o lugar no qual somente
a escura ave de nunca mais
Possa vaticinar o seu destino
Não há justiça nas palavras
De despedida nem no silêncio
Só há a falta
E dor
Olhos de dentro deitados em nuvens
Não há lamento no teu chover
Apenas um espremer carneirinhos
Brancos e cinza a mais não poder

Olhos de vento que moldam celeste doçura
Onde estão tuas certezas e alegrias
Se só tens ausências e imaginação
Como podes crer nesta profusão

Olhos de medo no caminhar
De quantos abismos de dois centímetros
Já tiveste que pular
E quantos ainda há a galgar

Olhos de dedo que furam o bolo
Sorrindo marotos da grande gente
de voz comportada e grande ralha
Tira o dedão sujo daí pirralha

E a pergunta criança não quer calar
Então não era pra olhar


Dedicado à Bia.
r assim estranho à terra
E às palavras de honra

Ir assim desastre ambulante
E precipício portátil de si

Um pouco vôo e poesia
Outro tanto enjôo e maresia

Porque é preciso ser Pessoa
Quando pessoa nem existia

Ir sim sem estranhamento
Narcotizado pelo amor em gota
Descobrindo - se nu como nunca

Agora é tarde o que o mar levou

Não volta
Poema do desespero existencial

Porque ser
Se você
Pode star
E quando não mais palmares houver
Pelo que lutar pelo que morrer
Deve haver uma pequena pátria
Entre Pasargada e Shangri lá
Que abrigue meu ser revoltado
Com a injustiça no mundo

Deve haver uma ilha um promontório
Para onde correr nos dias
Em que queiramos ler Neruda
Ou que desejemos ouvir Joplin
Ou Chico distraidamente
Entre os que querem o amor livre
entre quem for com quem for por onde for também

Talvez lá já estejam as barbas de Marx
Sérias demais para a simplicidade da divisão
Talvez não

Pode ser que os imortais tenham de fato morrido
E que alguns os estejam matando a mais
Destruindo e deturpando o que deixaram
Nunca se sabe

Haverá montanhas nas quais o sabiá
Possa cantar e onde Zumbi permaneça escondido
E jabuticabas decerto
Como as que comi conversando com tia Bicar

E se não houver tal lugar
Onde se possa reunir uns discos e livros
E no qual os amigos possam pensar criticamente
Sem perder o humor e o tesão

O jeito vai ser continuar lutando
Companheir@s
As coisas são assim
Quando não podem estar
Não há carneirinhos suficientes
Para trazer o sono
Aos que sonham ser desejo e aventura
Simplesmente não há cura
Para a palavra perdida que fere e detona
Mas é na sanfona que a vida respira notas musicais
Tudo são cais para a saudade
Quando a tempestade é de distância
Na vida de minhas retinas tão dilatadas
A libido transforma colibris em homens
Antes da madrugada os transformar em mel
Muitas luas passam pela janela
E nenhuma até hoje entrou de verdade
Apesar dos convites
E da cachaça
Os mistérios existem
Transformando a noite numa metáfora

Do seio de quem jorrou a via lactea
Amanhã não é dia de rosas
Nem de vermelhidão no fim da tarde

É dia das famílias perderem laços
De desfazer os passos
Na estrada do futuro

É a construção do velho muro
Em que gárgulas vigiam
O doce das crianças e tomam
As conquistas dos inocentes

Será um dia escuro
Que dificilmente vencerá a noite

Ainda que eles não passem
Já assustaram os passarinhos
Queimaram os ninhos
E reconstruí-los será tão difícil

Quanto o conquistar da consciência
Apaixonar-se pelo distante
Te torna errante da própria imaginação
Mas é preciso acolher o desconhecido
Que no outro há e age
Posto que não há quem se engaje
Na luta e no amor
Sem o favor e o desejo
Por isso cotejo inteligência e sensualidade
Pois não há tesão que sobreviva
Quando não há ideias e luta pela liberdade
Tomo-te como minha
bela recatada e do lar
Mar de cera e maquilagem
Calafrio do meu membro
Já catequizado e pálido
Penso noutra e cumpro
Minha obrigação carnal

Não leve a mal o desvio
Não há pavio que acenda
Nesta vela congelada
Procuro não pensar

No seu pé esquerdo erguido
Na pose da mulher que beija
O marido pela manhã
depois do café e cheira
a pasta dental e sabonete

Quem raptou o perfume
Da nossa juventude transviada
Quando nos tornamos
Criaturas de plástico
E o gosto do sexo nos abandonou

Qual o sentido de não transgredir
De não dizer baixarias
De não sobre a mesa ou na sacada
Para que o mundo fique com os ions
Ligeiramente erotizados

Agora há pouco vi adolescentes
Que se agarravam no parque
E tive intensa vergonha
Não do que faziam e deixavam ver

Mas dessa nossa maldita falsa moralidade
É molho de pimenta
que escorre dos corpos dormentes
Dantes ensandecidos

É do rasgar dos tecidos
Aprofundando a crase
Que se repisa a carne das uvas
Mudando as chuvas internas da felicidade
Em vinho

É esta bela desordem
Palco da fertilidade das almas
Fixadas às pressas no purgatório do querer

É do beijo metáfora da fusão a frio
Que começa o rio que passou em minha vida

É sempre assim caótica e ardida
Essa forma de ser e se tornar comida
Hoje sou todos os meus loucos
Não me repreenda não quero ser outro
Pretendo ser Bonaparte e Einstein
No mesmo segundo e fuzilar o mundo
Com meus olhos de raios xis super heróicos
Não me prendam com seus grilhões maniqueístas
Quero voar nos versos de Drummond
Ou me fazer guarda trilhos do trem do Villa Lobos
Aliás devo saltar entre uma nota breve e a mais longa
Na estação de Adoniran pouco depois de Pasargada
E por falar nisso era bem eu gritando toca Raul
No show dos Stones na praia
Não fique constrangida
Sua companhia pode ser só sexual
Não me importo de ser um pouco usado
Nem que meus filhos aprendam sexo na escola
Eu também era gamado pela professorinha
Mas fui beijado ainda um dia desses por alguém diferente
Pensando bem não me ache normal nesses dias atuais

Os homens de bem de hoje me dão ânsias
Quando ele veio ao mundo
O mundo veio a mim diferente
Um desejo de cuidados e mimos
Se espalhou pelo caminho
Transformando pedras em sorrisos
Depois diante da sua óbvia falta de jeito
Para caminhar sozinho
Vieram as risadas e as histórias
Os primeiros joelhos ralados e broncas
( que não adiantavam muito)
E aquele amor
Aquele desejo de carinho e mimos
Foi sendo esticado
Aprendido
Torturado com cócegas
E pilhas de gente feliz
Hoje já bem mais largo
Mas não idoso
É hora de comemorar de novo
O momento de inspiração poética
Que tivemos sua mãe e eu
E que assim sempre seja
Com carinho alegria e felicidade
Seja bem nascido sempre
e a cada ano nesta mesma data
Lindo filho meu
Embora eu realmente não goste de futebol, tive que fazer este poema em homenagem aos amigos vascaínos...


Sem o F flamengo vira lamengo
Algo saído da lama como Adão
feito pelo senhor e meio lamurioso
Mas humano sobretudo humano

Sem o F fluminense luminense vira
Todo pó de arroz paetes e lantejoulas
Muito brilho e luz e alguma frescura
Que ninguém é de ferro

Sem o B Botafogo vira otafogo
Como quem suspira para se manter
Acima da linha da segunda divisão
Clamando ó tá fogo viu

Mas abaixo dessa linha se você tira
O V do Vasco tudo é só asco e decepção
Como entender o olhar perdido
Do homem sentado no meio fio
A fitar o vazio
As janelas do ônibus avançam sem resposta
O homem fica parado

Ele e o vácuo num duelo de dor
Em busca da rima perfeita (como se fosse preciso...)
Nas férias não sei o que fazer
Assistindo Kramer versus Kramer
Achei

FORA TEMER!
Sim já tomei cinquenta e um tombos
E depois de tanto tombamento
Sinto-me eterno em mim
Como se os outros todos
com quem me divido diariamente
Aplaudissem a coragem de levantar
Todos os dias e lutar pelo que creio
E pelo que crêem os que deixarei um dia
Quando não houver mais tiranos
E usurpadores a derrubar
Nem poemas a escrever
nem busca pelo amor ou pela liberdade
Só tenho de meu um carinho
Que guardo não sei porquê
Devia dá-lo nas estradas
Ralar sua pele nas margens dos rios
Deixar que fluísse perdido no oceano

E nem sei mais onde o guardei
Talvez no seu corpo
Talvez nas palavras doces
Ou nessa dúvida estranha
Que me assalta em plena madrugada

SONETO IN VERSO


Não navegar não é mais necessário
E a Dinamarca vai muito bem obrigado
Não me pergunte por quem os sinos dobram
Pois certamente não será por você

Sua responsabilidade tão pouco alcança
Àqueles que são cativados
E por mais palmeiras que eu veja em meu solo
Sei que nelas não há sabiás

Ser ou não ser já não faz diferença
Ao politicamente correto
E nunca mais never more será

Se você for gauche na vida
É possível que tropece numa pedra
E nonada vire uma estrela inútil
Não era pra ser assim
Mas fui poeticamente educado
Sentidor que sou das dores do mundo
Grande e desimportante como coração de mãe

Não um anti herói de filme americano
Cuja trapaça e narcisismo
Superam a tudo e a todos
Inclusive os medos que temos do passado

Nem um herói fabricado
Filhote de ditadores e ditaduras
Que segue a linha reta do tesão nacional
Obedecendo obedecendo obedescendo

Mas um enorme ser miúdo
Como uma flor do asfalto
Essa coisa que resiste e pulsa em todos
Que se importa com cada um

Semente do que um dia sonhamos
Quando alegremente dividíamos o pão
E não havia palavra de amor que não soubéssemos
E nosso nome ainda era Bem Comum
Ainda antes de ser criado
Foi devolvido à lama

Não prestava

não tinha dons especiais
Nunca recolheria impostos
Nem poderia ser importante

Era talvez outro filho do medo da noite
Mas a mata onde estivera
Era concreta impura
Como uma jura de ministro

Até Geni uma vez o recusara
Mas nunca recuara o beiço
Partido de pancada
Diante de nada que se dissesse superior

Queria poder dizer
Que foi lindo seu destino
Mas não é assim que a vida sem poesia é

Foi encontrado ontem no beco
Cada lado da boca
Orando pra um santo diferente
Se havia sonhos também estavam em frangalhos

Resto de lodo no caminho dos ratos
Isso a vida ensina
azeda amora
amor também dá azia
Fui achado no lixo
Não quando nasci
Ou na mais tenra idade
Mas depois de velho

Hoje tento
Acreditar em reciclagem
Poetas sabem das coisas
Quando advinham um mundo
Incompleto e a fúria do vazio
Poetas podem viajar no assovio
Do vento das almas e voltar
Ilesos ao seu ser comum
Lidos e relidos como páginas de anuário
Todo poeta têm um diário de bordo
No qual a horda de acrobatas
Que ele devora e pela qual é devorado
Segue um rumo equilibrado
Poetas tem um outro lado da face
A oferecer a quem os ameace de viver
Poetas não sabem morrer sem drama
A menos que a dama seja ainda mais
E viva nos ais mesmo quando goza
Poetas em prosa rimam sentidos
Ou são os ouvidos que ritimam a frase
Poetas da crase procuram mais no fogo
Que funde corpos e essência no mesmo jogo
Mas os poetas mais temidos e cultuados
Não são esses bardos de pouco valor
São aqueles cujo maior favor à humanidade
Foi demonstrar sua insanidade
quase batuquei um samba de contente
mas aí a vertente norte da consciência
deu uma advertência ao meu ser dual
e foi um carnaval de altos e baixos

entre achos e desachos fui ficando rude
e tudo o que pude salvar foi um número
colado no úmero meu osso da sorte

meu forte é dois com ele sou gangorra
e até que alguém morra dentro de mim
vou morrendo assim chorando de contente
mas linda e estupidamente vivo de triste
Gardel surge repentinamente no vento
A imaginação libidinosa
Agradece as memórias do que não vivi
Seguimos eu e ela a quem nunca vi
Embolados em gestos bruscos e lentos
Evoluindo do perfume do som ao gozo trágico
Que funde tristeza e contentamento
Crise pra falar da sua boca
Dentes e mais dentes
Sorrindo assim sem inocência
Na graça da fome
Devorada e devorador
No clarão esbranquiçado do entrelinguas
Crise de presa fascinada escorrendo
Sangue e desejo pelos olhos revirados
Crise no pescoço hirto abocanhado
O cabelo sempre em desalinho
Alinhado arrebanhado unido num puxão
Crise pra falar dos outros cosmos
E de como se sai do corpo invadido
Mesmo estando nele
Apenas para entrar de novo
E reconhecer o diferente
Crise de não querer satisfação
Posto que a eternidade está logo ali
Palpável e polpuda como um projétil
Crise nos sonhos de bangbang
O herói montado perseguindo a si mesmo
No labirinto lúbrico que sou
Crise nos nomes que assumo
Vezes sem conta como se fora a dinheiro
ou meramente para provar ausência de castidade
crise na mão pesada que todos fingimos condenar
e que não há lugar melhor onde se encaixe
que nas cores que ela espalha
Crise de terra prometida
Novo mundo em que se plantando tudo dá
Ingovernável desenfreado loucamente
Crise de não ter mais onde e precisar
A bolsa sobe e desce regularmente
Mesmo na pior das crises
Crise de não ter mais pensamentos e desvios
Vem vindo vindo vindo lindo lindoooo
Uivo incontido e lento como a morte
Morrer é a melhor das crises
Crise do leite derramado
Será que chorando um pouco
Mais leite virá
Chamei seu nome no negrume
a noite irônica deu voz aos grilos
Tentei voar ao seu encontro
você tinha compromissos inadiáveis
Sonhei com suas mãos dando formas
Aos nossos desejos
Nem as sombras das paredes se moveram
Então corri e corri gritando
E nada não sucedia
Só a sensação de vazio crescendo
Até que não havia mais chão
Caí
E ca indo descobri
Que não sabia mais distinguir
Sonho e vida real
Só havia o desespero da queda
Solitária e sem fim
O medo virando eu
Sem acordo com a realidade
Nem mesmo o despertar repentinamente
E daí se gosto de mulher zarolha coxa
Que também gosta de mulher
E melancia

Daí se curto homens barbados
Com cabelos cor de rosa
E pelos púbicos encaracolados

Faz diferença se saio na noite
beijando todas as bocas
Amando todos os botes
E sem cueca nem identidade

Não ligo se você é contadora
Num escritório de conto de kafka
Se sua fronha é mordida lambida chupada
Não me importa nada

Apenas saber que em algum lugar
Você está bem e que ama

Saber-se não amado
É quase tão solitário
Quanto a solidão

Ao invés de apenas um
Tem dois lá
um que não está
E outro que espera
Gosto dos disfarces do desejo
Quando vejo a fresta ensombreada
E penso que nada nada há ali
E mesmo assim a vista não desvio

Gosto dos tropeços do olhar
Do que ele esconde e mostra
Ostra de pormenores nele incrustrada

Gosto das obscenidades
E do gosto que elas têm
No dia seguinte
Mesmo quando não declaradas

Gosto das entradas e bandeiras
E das banheiras vertendo água

Quando o corpo nelas afunda
Aliás, gosto dos nãos ditos
Dos malditos das putas dos ritos

Me entendo com os aflitos
E com os que nunca estiveram acolá

A imaginação essa floresta de vontades
Tem gostos, gestos, toques e cheiros
Que ainda não estão lá

Tenho medos arrancados à semente
Que guardo comigo como fetos de laboratório

Tenho preces cujo sentido nunca compreendi
E santos cuja vida exemplar me excede

Ululo na noite em busca do gozo perdido
À procura de quem aceite partilhar minhas mãos

Jogando o xadrez das estrelas com o sólido da solidão
Insólito em minhas rezas sou raso nas crenças
Mas quero esquecer o cinismo e amar ao luar

Sim coleciono estampas de sabonete
E velhos poemas sentimentais de quando

Já nem sei por onde ando
Contudo tenho o semblante calmo dos campeões
E dos que saúdam a incomunicabilidade das gentes

Forjo heróis que não se sustentam
E me obrigo a lutar com eles
contra minha própria tirania

Inda agora vi surgir o tal novo dia
Não trazia novidades
Apenas os mesmos lindos doces prazeres e dores

E a sensação de que viver e lutar
é importante e necessário

Mas não sabemos bem o porquê
E se quando você chegar
Na terra do nunca perceber
Que nada nunca estará totalmente resolvido

E se desistindo deste não lugar
Você chegar em Shangri-lá
descobrir que também faz frio ali

Indo pra Pala não ouvir pássaro mainah
Dizendo do aqui e agora

E você der o fora e ir chegando no El dorado
Perceber que nem tudo que reluz é lucro

E se meio maluco no país das maravilhas
Você se encontrar e o sorriso crescente
Do gato não lhe iluminar

Na Atlântida você afundar
Que outro deslugar
Você poderia visitar além de Pasárgada

Cujas prostitutas bonitas já têm até sindicato
E depuseram seu amigo rei em festiva revolução

Talvez meu irmão
Seja hora de voltar
Com o filho pródigo abraçado

Na boca uma velha chanson de guerre
Cheirando a cachaça por todo lado
E em casa permanecer uns dias socado

Poema de Aniversário para o amigo poeta Devair Fiorotti

Se vierem me contar dos dias lá fora
Direi que o agora é sublime
E que é de vime o trono de onde reino

Se vierem me falar em reformas e outras agruras
Direi que são puras as almas do desejo
É que não há despejos entre minhas paredes

Se vierem me avisar que a montanha em que vivo
Pode algum dia explodir em lava e fogo
Direi que é do jogo incandescer quando não há lua

De mel pode ser a voz que venha advertir
Que tudo que faço é só me divertir
E que não guardo pro infeliz amanhã

Minha vida cunhã é viver de amor e amizade
Minha verdade se estende pelo meu jardim
A felicidade deste modo sempre sorriu pra mim
Já fui
Escravo da sua beleza
E me quis à mesa
Como alegria e repasto

Mas estou gasto
De tanta palavra passada
Desta voz traficada dentro de mim

Sempre disse sim dizendo não
Foi excitante minha negação
Agora não sei mais

Preciso cantar a paz
Que há no sacrifício

Ossos do ofício

Provocações - Roberto Mibielli x Aline Keindel

I

Ah, doce veneno
Que me condena
E ensina que a sina
Do que ama envenenado
É só ter um amor
Eternizado

II

Pois eternizo-te
Como os versos de Neruda
E esse amor
Que agora escrevo
Em linha torta
Que desnuda

III

Nu já me sentia quando
Dançando nos seus versos
Transbordados das palavras úmidas
Que entremeavas de vírgulas e ponto
Escorrido do encanto dessa língua
Me sentia eterno de momento

IV

Se já desnudos
De roupa e vergonha
Espero as respostas
Com cara risonha
Me dê já o corpo
Com todo teu gosto
Não vou me aguentar
Ah, detesto esperar

V

O que a espera tem
de tântrica necessidade
O gozo tem de felicidade
Nesse caso espera e cilada
Tem mais a ganhar na pegada
Uma mordida no pescoço hirto
Que não aguarda faz desse rito
Uma deliciosa jogada

VI

A jogada que sei é rasteira
E brinco como feiticeira
Beijos e lambidas: fuzis
Eu mato com mexer dos quadris
No final, só deixo a carcaça
E saio rindo de graça

VII

Aí que Inda se ri a marvada
Me deixando tonto de rebolada
Nem sei mais a quem me pertenço
Se esvaído ou renovado mereço
Beber seu néctar toda madrugada
Ou me deixar beber até não sobrar nada

Diálogo em dez tempos - Aline Keindel x Roberto Mibielli

I
À vezes
tem 'likes' que vêm
como metralhadora.
Fuzilam meu coração
e eu fico toda boba.

II
Quando te laico
Por atacado
É porque te quero impura
Dona de todo pecado

III
Pecado é meu sobrenome
Se não acreditas, meu homem
É porque ainda não te fiz sofrer
É no gozar que virá teu perecer

IV
Se a laika foi a espaço e voltou
Se minha pele em você pensou
Antes de mim e do meu gostar
Porque não nos seus braços ressuscitar

V
Há algo estranho no meu abraçar
Coisa que foge do meu controle
É casa ou tormento que pode desgraçar
Tudo depende como em mim cê se cole

VI
Colo como ventosa e chiclete
As vezes sugo tudo noutras estico e puxo
Mas não se preocupe com esse bruxo
Meu amor também é meio bandido meio pivete

VII
Pro bandido eu grito: “pega ladrão”
E faço de minhas pernas uma grande prisão
O pivete, danado, eu pego no colo
Sussurro no ouvidinho e quebro o protocolo.

VIII
De protocolo quebrado
E dessas lindas pernas aprisionado
Só me resta celebrar o aconchego deliciado
E me fazer néctar e flor para seu agrado

IX
É assim que te quero
Completamente submisso
No quarto, horizontal bolero
Vão indagar teu sumiço

X
Mas há uma condição primordial
Para que se complete o feitiço
Há de ser amplo o tragar e total
E que seja dentro de você o sumiço
em-vinda senhora
Desculpe meu olhar tão distraído
Não há olvido nesta dispersão
Apenas uma preocupação constante
Com o fim dos caminhos
Com as palavras mortas já sem sentidos
Com o atrito engraçado dos chinelos
Nas pedras soltas da estrada

Sinto não ser prestimoso ou gentil
Mas há na lua hoje grande alarido
E os grilos já festejam sua chegada
Mais do que poderia em minha humildade

Não há como concorrer com as estrelas
Que se jogam riscando o vazio
E se perdem buscando seu olhar tranquilo

É sabido senhora que se pudesse seria
Sua montaria e seu campeão
Mas não há liças nem pradarias
Onde possamos desafiar os moinhos

Ademais sempre que possível
Prefiro beijar sua imagem no camafeu
Ele sim é meu minha única posse

Talvez fosse diferente se tivéssemos
uma kombi psicodélica
E estivéssemos voltando de Woodstock
Com todos nossos amantes e amigos

Nossos maiores perigos seriam os velhos
A falta de livros de filosofia e o fim da erva
Mas confesso que velho estou há algum tempo
E já não sei ser livre desta liberdade

Meu coração em trevas apenas perscruta
O que ainda há a percorrer
E experimenta em poucos sexuados feriados
Alguma pequena forma de morrer
O cru do ódio é o alheio
É o meio da alteridade
É a verdade com escamas
Que está nas camas das empregadas

O cru do ódio exige silêncio
Mas onera o ar em pestilência
Condecora generais e golpes
Com os rumos da nação em gasosa evidência

O cru do ódio vê na pele a distância
Vê na arrogância argumento
E sem que o animal assim se comporte
Se comporta como jumento

O cru do ódio bate na mulher
E em quem mais se meter
A besta e pensa que festa
É quando ela não deixa

O cru do ódio acha que tudo é mimimi
Que defender quem sofre é bobagem
Acredita sempre na meritocracia sagaz
Mesmo sabendo que uns precisam trabalhar mais

O cru do ódio se faz desentendido
Ou reage dizendo não ser divino
Quando um menino gosta do outro camarada
Ou quando a menina tem uma amada

O cru do ódio só não percebe
Que o mundo está morrendo
Porque o alto lixo que acumula bucólico
É quase todo seu capital simbólico

Inclusive os ruralistas agradecem e pedem
Benzadeus que sobre ele jamais se feche o cerco
Porque enfim o cru do ódio é muito bom
Pra fazer esterco
No molde em que o mundo foi criado
Os ombros das mulheres o pescoço
E o início do decote estavam além do divino
Entre o animalesco e a morte
Deixar em todos os postes
Em todos os muros
Um pedido
Uma lamúria
Uma demanda estridente
Perdeu-se a dona de um cãozinho
Agora abandonado
Recompensa-se bem
a quem a trouxer
Para o meu lado
Do mal me quer fez uma cena
De pétalas arrancadas
Jogadas no chão
com fúria e desdém
inquieto e contrariado imaginava
Seu destino sem Rosa

Foi preso minutos depois
Uma flor não se maltrata
Nem pelo amor da mulher
Meu corpo clama
Reclama seus direitos
Sobre os cheiros
Que a saudade deixa nos panos
Sobre os planos de vida conjunta
Cobra a conta do acordar sozinho

De fininho saio de mim
E te alcanço na distância
Faço da tua errância
O agasalho do meu abandono

Já não tenho sono
Agarro a última escuridão da madrugada
Com a fumaça de um cigarro
Achado na gaveta

Será que é perneta
Esse meu buscar do teu vulto
Será que astuto ele não quer encontrar-te

Minguada de ilusões pelo tempo na cômoda
a fumaça esmorece sem vida
Nada alucina nada ilumina teu paradeiro

O menino padeiro ou leiteiro
O mesmo que daqui a pouco
Jazerá sem vida no beco
Passa apressado
Sei que ao meu lado dirias
Salva-o

Talvez pudesse evitar seu destino
Mas ele menino cheio de esperança e fé
Não acreditaria

O inexorável também pode ser poesia

Tua ausência determina minha falta de tesão
Para a vida
Cético cínico
Caso clínico de estima ultrajada
Penso no nada que é ter o caminho
E nele não haver transeunte

A vida em meu delírio
Não imita mas
detesta a arte

DEIXAR-SE DEGUSTAR

Deixar-se engolir pela multidão comovida
Que grita pelo que deseja
Seja um gol
Uma reivindicação
Um salvamento

Deixar-se absorver pelo trabalho
Pela luta
Pela alegria famíliar
Ou apenas pela euforia de ser
E estar

Deixar-se mastigar pelas rodas do capitalismo
Pelo cinismo dos chefes de seção
Pela intersecção do clima e do dinheiro
Pelo banheiro sujo do bar
Pelo seu lugar no universo em expansão
e no fado

Deixar-se abocanhar pelo espírito santo
Por tanto pilantra em pele de dízimo
Pelo ínfimo da matéria brilhando
Flutuando na tarde poeirenta ao redor

Deixar-se tragar pelo desejo alheio
No olhar ou nos dedos
Que percorrem sós o próprio proibido
Inventando gestos e feiras
Das quais você talvez nem quisesse participar

Deixar-se consumir como fumaça
de civilização decadente
Como ente ou entidade
Entre tambores canibais e ancestral idades
Um sopro de luz nos pulmões da razoabilidade

Deixar-se trinchar nos dentes gauches
De ser torto em linhas retas de vida
De não aguentar despedidas
De voltar ao mesmo assunto e opinião
Do querer não querer desejando muito e fundo

Deixar-se antropofagizar pelos que partilham
A carne e os feitos
Pelos símbolos em rotação
Pela linguagem oculta da ideologia
Pela orgia das possibilidades

Deixar-se assimilar pelo domingo em família
Pela milha e meia que separa opiniões
Pelos peões no tabuleiro e pipoca na panela
Pelo filme abraçadinho
(Mesmo os do Tarantino)
Pelas crianças que tornam Herodes natural

Deixar-se comer comendo
Comer e dormir
Dormir e comer
Todo o tempo repetido no corpo e nos sonhos
Nas promessas e nos vazios

Pois além dessas alegrias
Há quem regurgite
Quem refute o se dar
Odiando o amor
Mesmo o alheio
Temendo ser devorado pelo prazer
Ou tê-lo como esteio

Que a paz gourmet lhe seja bem servida
No ano novo que se inicia e na vida
Da carne fez um navio
No mar bravio
pretendia se lançar
Descobridor desbravador
Bucaneiro corsário pirata
Não trazia mapas
Na ponta da língua
Mas sabia que rotas traçar
O que descobriu ou assaltou
É pouco sabido
O que se sabe mais certamente
É que naufragou quando pôs anel
E propagou sua semente
Ali ne'la havia dança
A trança das pernas
Transando o oito deitado
E infinito
O bonito do ali nesta vida
De tantos lá
Um ká de akonchego
No sorriso maroto e triste
Esse viste
Que exclamamos
quando supomos que tínhamos razão
A vazão inteira de itaipu
Em pleno gozo
E eu Bozo
Pensado por toda uma era
Ali n'ela kein'dehra
As palavras nascem pensas
Imensas elas perdem os sentidos
Quando chegam aos ouvidos

Desacordadas sem nexo
Plexo ou sexo balbuciam
É tanta subida
Tanto peso
tanta semia

Que semear-me não podia
E me quedei
Palavra sem tempo

Num tempo sem palavras
Errei
Tive febre
Ódio
Desespero
E como mero joguete
Atirei a primeira pedra
Depois veio a segunda
Na terça e na quarta
Ninguém reclamou da atitude
Juntei todas as pedras que pude
Menos a de Drummond
Essa deixei no canto empoeirada
Não adiantava nada ter uma pedra consciência
Comecei a colecionar mortes
De pequenos bichinhos torturados
Passarinhos lagartixas minhocas
Que se moviam mesmo depois
De cuidadosamente seccionadas
Dei vazão à raiva
Da intolerância fiz minha bandeira
E da banheira apoiei ditadores
Pelo rigor contra a bandalheira
Beijei a mulher do vizinho
Espiei sua filha se trocando
E quando ela não quis
Observei que curava lesbianismo
Assim mesmo não me dei por satisfeito
Peguei dinheiro de candidato a prefeito
Estacionei na vaga de deficiente e velho
Porque nem existem tantos assim
E por fim animado do forró e cana
Levando as kengas pra um programa
Passei por cima de um pedinte
O erro foi não ter voltado
E acabado com a aporrinhação
Agora aqui sem motivo
Vendo nascer quadrado
O que a todos ilumina
Ouço dizerem contra mim
Que devia morrer
Que não faço falta
Que sou um estorvo
Uma aberração
Pera lá cidadão
Isso tudo é pra quem culpa tem
E eu
Eu sou cidadão de bem
mais um dueto com essa maravilhosa poeta Aline Keindel que descobri virtualmente e que grande alegria tem me dado!! Divirtam-se!

AMÉM!

Foi um daqueles términos
de algo que nem tinha começado
Com coração despedaçado
Aceitaram sem mais brigas o desatino.
Um aqui, outro acolá
A distância fez-se métrica
A paixão que é elétrica
revoltou-se, não morreu
Vou ligar mais uma vez
ver se a moça me esqueceu
Ela atendeu e moderada
foi amiga, a desgraçada
- Oi, como está você?
-Não precisa responder.
Aguardando o implorar
recebeu como resposta:
- Estou bem,
bem mais composta.
Sem saber o que fazer,
o moço se descabelou
Sem mais graça disse adeus.
Perdeu-a pra sempre.
Benzadeus!

ALINE KEINDEL


Talhado de fantasia
O amor fez-se grumos
quase queijo
Sem aprumos
Suplicou pelo beijo
E outros rumos

ROBERTO MIBIELLI


O rumo já foi decidido
do queijo eu tiro a goiabada
Romeu sem Julieta
Nova jornada.
O beijo posso até dar
em outra boca,
pro seu azar.

ALINE KEINDEL


Nada no reino
Nem na morada
O que fazer quando
O clown perde a amada
É mister fazer-se disfarçar
De outra boca outro par
Só assim pra novamente
Seu beijo provar

ROBERTO MIBIELLI


Os meus beijos já verteram
todo mel pelo teu corpo
Gananciosos esses lábios
também sugaram teu anticorpo
E hoje assim, todo estendido
sem força nem ânimo
um animal sofrido
te deixo, você que já me deixou
Vá ser de outra um marido.

ALINE KEINDEL


Não me queira de outra marido
Que me sinto traído de mim a mim
Se deitado e esvaído
forneci contraveneno
Foi pelo sereno que bebemos
todos esses anos
Ainda assim despachado
Entregue ao outro lado da força
Procuro quem distorça minha face
E me trace um outro perfil que te encante
Se não posso ser esposo
ao menos amante
E se pareço infame em meu desejo
e proposta
É que o mal de quem gosta
Nunca foi a sinceridade
Esse é o mais ledo engano

O amor é desumano

ROBERTO MIBIELLI


Desumano foi o que você fez
Desistiu da minha noite
Esqueceu-se que na escuridão
Sob as estrelas, eu tiro o açoite
De qual sereno você fala
Se vivemos em convulsão?
E por vezes me pergunto
Não era pelo sexo, nossa pulsão?
Façamos esse compromisso
Que eu te quero sem te querer
O anel já foi pro vaso, o desejo insubmisso
Teu corpo mais uma vez vou transcorrer
Encontre-me lá pelos becos caídos
Não me dê mais beijos com bafo de cerveja
Sabendo que de futuro estamos destituídos,
Levante meu vestido sem que ninguém veja.

ALINE KEINDEL


Quem entre nós gostava da aventura
Dos olhos alheios adivinhando os passeios
De nossas mãos e pés sob a mesa
Quem de princesa quando a noite iniciava
Me viciava na escrava depois da hora do parabéns
Quem buscou mil reféns imaginários
E os amarrou sob as estrelas nos meus ouvidos
E nos tornou feridos de tanta injúria e desejo
Sim vejo que nada de simples há mais no sexo
Nem nexo em buscar outra essência
Em que me banhar que não a sua
Que seja novamente indiscreto
E que seja em plena rua

ROBERTO MIBIELLI


Cadê você que não te vejo?
Vim com a saia sem a calcinha
A minha blusa é de alcinha
Tudo o que gostas, pro seu festejo
Já é tarde da noite
Os bêbados saem do bar
O frio começa a doer na pele
Olho para os lados. Você não está
A raiva invade o meu coração
Briga espaço com a humilhação
Sabia que era cilada
Mais uma vez,
Abandonada

ALINE KEINDEL


Detrás do poste apagado
Embriagado de tua cor
Achei melhor me acovardar
Era tanto amar e esperança
Que entrar na dança podia ser meu fim
Doava um rim pra ter-te novamente
Mas imediatamente me sabia aprisionado
Fui ficando ali sem lado que vencesse
Sem que pudesse chamá-la e me submeter
Foi nesse ser não ser que para meu terror
Você se foi em dor e pranto
Enquanto eu ali parado
Continuei atrás do poste
apagado

ROBERTO MIBIELLI
Procuro alguém
A quem doar
Parte da minha felicidade

É muito ruim
Ser feliz sozinho

modinha

Quis me tornar
adepto do culto
A sua divindade

Logo eu
Que tenho
o diabo no corpo
Se te queres de volta
Dá outro giro nesse comboio de corda
Que tu chamas ilusão
Que te liberto de mim
No nosso desejo

Aproveita e caminha nele
E se quiseres cavalgá-lo
Saiba-o manso até que fustigado
Mas não o deixes de lado
Imprestável como as flores murchas
Caídas das cerejeiras depois da primavera

Pondera que é da vida o labirinto
Que é melhor o tinto na maioria das ocasiões
E que nas estações do teu ventre
Há um entre escrito em brasa
Que me faz querer
Que aí seja minha casa
Do alto de seu focinho
Dizia ao mundo eu sou
E como se não bastasse
O ar de conhecimento
A se perfumar de identidades
Havia a cauda
A abanar as incertezas

8 de março de 2016

Ando de mal com a lua
Logo eu que não consigo
Fixar os pés na terra
Nem sei aonde mais
estacionar a imaginação

5 de março de 2016

Lenda do Pôr

Suava seu pão no claro do dia
Era negro de um negrume mau
Como os versos de uma revolução sangrenta
E no seu negro negar havia ritmo e sedução
Umas poucas palavras escuras
Duras como a lida dos bordéis
Cobriam sua pele com cicatrizes simbólicas
Em que o ódio podia penetrar vergastando
Não chorava como era de esperar
Nem tramava vinganças terríveis
Não era um clown shakespeariano no umbral
Nem um verso heróico de Gonçalves Dias
Um homem comum ser comum filho
Do caos e à deriva como todos nós
Que podia ter sido o leiteiro de Drummond
Até mesmo personagem malandro de Jorge
Amado ou não em vida quem sabe
Mas o chicote não parava de estalar
Nessa malignitude que diziam existir em sua cor
Não sabia mais de suas dimensões e tamanho
Foi aos poucos ficando alaranjado
Adejando idéias e dores nos rumos
Como as brisas que querem se irmanar às ondas
Foi se avermelhando até ficar definitivamente
Como ficam as pessoas cujo sangue
Cobre a carne vincada dos caminhos
Sem volta do ódio pelo açoite foi crescendo
Não podia redimir a humanidade não era quisto
Confuso e sem poderes que não
O anacronismo dos heróis comuns
Foi cobrindo o céu com suas duas cores
Que iam aos poucos se mesclando
Assim entre o avermelhado e o escuro
O sol se pôs
Desta vez para todos
Em cada inferno em que ela estiver
Serei seu vampiro da guarda
E lhe darei conselhos obscenos
Massageando-lhe os pés descalços
Com seus passos medirei o destino
De nosso desatino farei uma choupana
Onde a lua possa vir se balançar
Num crescente entre os galhos
E nossa pressa e nossos atalhos
Nos levem de volta aos abraços
Que deliciados experimentamos
quando deixamos o paraíso
Na segunda devo
caminhar em frente
E nunca olhar pra trás
Não pensar no cheiro
Dos lençóis e no gosto
Das histórias que construímos
Fui um ogro um cavalo e até bandido
Você me abduziu medicou
e deu seu líquido
Pra matar minha sede no deserto
Nossos personagens jamais
Sentiram fome de tão famintos
Nem desceram das nuvens
Mesmo com a perda das asas
Então em nome dessa beleza
Amanhã não devo me virar
Ao cruzar com sua estátua de sal
Não posso me sentir tentado
Nem mesmo a dar
Uma última lambidinha

25 de fevereiro de 2016

Fiz essa croniqueta inspirado no contínuo e lindo escrever de Sheila e Samara, mas, e também em resposta àqueles (as) que dizem por aí, a título de desculpa, quando flagrados em suas pequenas corrupções diárias ( parar em fila dupla pra deixar os filhos na escola, furar fila, pagar propina para escapar de punições, etc...), que a culpa é dos políticos, que eles são os "verdadeiros" corruptos do Brasil e que "O EXEMPLO DEVE VIR DE CIMA"....

Era uma vez um Exemplo Esse era daqueles de topete e casaca Elite da elite elitista de referência Mas a vida não é sempre boa com os bãos nem é sempre vida ad infinitum Um belo dia caminhando sobre uma alta ponte o exemplo elencava de si pra si as agruras nada exemplares do seu definhar os fios do destino quando se deu conta de que adejava sobre a murada em ritmo de Bolero de Ravel Dificuldades somadas o extrato consolidado apontava outros rumos e sobrevoos O exemplo sem exemplo maior a seguir desarvorado e indigente de fado observou em rápida despedida a seus botões que não desejava seu destino a ninguém No entanto sem se dar conta do peso de sua singularidade exemplar nosso amigo chegou de chofre acompanhado dos que o seguiram em sua hierarquia ao colo de uma honesta família que ali passava sem nada dever ao mundo
Família espalhada miolos espalhados órgãos espalhados e demais esparramos devidamente desordenados abaixo do alto viaduto deu - se a conclusão Seguir exemplos vindos de cima acriticamente pode resultar na dispersão irregular da racionalidade alheia Esse foi talvez o destino dos inconsequentes
Poema feito e dedicado à Eli Macuxi e ao Vavá, em resposta ao lindo e saudoso poema publicado ontem no blog dela www.elimacuxi.blogspot.com

Se como dizia a poeta
Minha vida como a sua
Também findasse
Não haveria impasse
Não haveria dor nem sofrimento
Mas em que momento eu saberia
Dessa minha súbita calmaria
Desse libertar de alma e corpo
Não seria no copo correndo
Na mesa entre letras e números
Não seria nos úmeros vazados de tutano
Nem no assobio do vento que ali fez morada
Talvez ficasse gravado no punho da espada do destino
Que um dia deste menino fez cavalheiro
Não haveria um letreiro
nem mesmo as letras miúdas do contrato
Indicando a rescisão
Aonde gozaria da sensação de descanso
Se não houvesse depois do lanço de escadas a subir
Um sofá uma birita
Para apreciar a vista
E um São Pedro de plantão
A indicar meu futuro lugar
No maniqueísta panteão
Sei da sua dor poeta e do quanto
Ela também me dói no seio
E sei que a gente as vezes cansado do permeio
Diz desejar estar na companhia do que se foi
Por isso é que justo sei meio em pranto
Que o quebranto e o desejo que nos ativa
É coisa de gente triste talvez por um triz
Mas ainda felizmente viva
Quatro esquinas beijam
minha alma de fronteiras
Esquinas ribeiras
Esquinas videiras
Esquinas matreiras
do merengue da salsa
Esquinas da falsa
impressão de riqueza
Quatro que acabam desaguando
Em esquinas de notas verticais
da realeza em cascatas
Do ocaso filtrado de núvens
Esquinas das matas
Com o lavrado
Esquinas do lado latino
E da terra perdida
Encontro de acaso e destino
Esquinas da minha vida
Um amigo fez café na cama pra esposa e dedicou a ela o soneto de fidelidade do Vinicius de Morais. Ela, feliz de vida, postou no face a façanha. O corretor de texto do celular, no entanto, registrou o nome do poema como

SONETO DE FINALIDADE

(pra não perder a oportunidade fiz pro casal em lua de mel este soneto decassilado)

Se morrer entre teus seios macios
Se quando acontecer entre nós dois
Não houver arrependimentos depois
Se cavalgando teus olhos vadios

Puder ser um ser quase infinito
Se buscando nos teus sinais achar
Meu destino redenção paz lugar
Se juntos formos um ser mais bonito

Se toda manhã o perfume em mim
For travessura da noite passada
Saberemos que não haverá fim

Essa nossa deliciosa insanidade
Assim será até a hora marcada
Findando assim minha finalidade
(Poema escrito em resposta ao poema de Eli Macuxi no blog elimacuxi.blogspot.com )

Já fui feito afoito
E acoitado enfeite
Das tuas dores
E prazeres
Quando sorris
Sou rio e rego
Indecente tua planície
Me alargando e estendendo
Entre tuas margens
Indo e lindo nas lidas
De te sonhar meio morta
Meio torta de intensidade
Vou fluindo onde não vês
Sentimento e eternidade
Amar tuas vontades
Como as tempestades
Amam o jardim
Abocanhar tua baila
Como quem se ala
Do teu jazzmim
Enfrentar teu moinho
Salpicando de vinho
Tua madura crisálida
Avoar teu refrão aos ventos
Como se nossos movimentos
Colorissem a madrugada
(E porque um tapinha não doi... minha versão gaúcha do Che ou seria tche?)

Ai de quem endurecer
sem perder a ternura jamais...
Seu gosto é de fazer
amor com as estrelas
E de infinitas querelas
na carne dos porquês
De deixar cismando ipês
na iminência do perfume
Fazendo arrastar impune
O olhar em infusão
Tentadora contramão
abre a pele como livros
Em palavras de paixão
Deglutindo-se em versos
Sabotando universos
Faz que chovam meteoros
Explodindo-os nos poros
Nos tornando mais travessos
O ruim de ter seu nome em V é que você é sempre o último a ser chamado quando sabe. Quando não sabe, ela faz um sorteio e a sorte, que sempre demora a chegar ao V, lhe abandona.
Uma vez, todo sabido, achando que tinha chegado a minha vez, me pareceu ter ouvido falar de uma inversão da ordem. Meu discreto e recolhido ego se apressou em pressurosamente se preparar para o chamado natural, carne e alma, mas... um corrupto, atrasado e uma maçã, foi o que me tirou os devaneios e os postergou.
De outra feita, mais feliz, observou-me à socapa: - Lindos olhos distraídos, V, cuidado, feche a gaiola, senão o passarinho foge!
Por muitas noites me perguntei se minha vontade de libertar passarinhos, essa minha noção de perpetuação das espécies aladas, esse meu senso ecológico, não teriam sido fruto desta observação.
Nada aconteceu que não tivesse sido inteiramente imaginado, desde então. O gosto de derrota na boca da libido ajudou a memória a não superá-la. Ficamos, em sonhos.
Em tempos de cólera me punha a dar tratos à bola sobre e se. Hoje planto flores nas palavras como quem deseja a liberdade aos passarinhos. E, sempre que posso, dou aquela flertada com o passado, para saber do presente.
Dela só o que sei, além do que lembro e do que inventei, é que a vida, por menos importante que possa parecer, deve ser seduzida. Shereazade transformou isso em sobrevivência, Clarice no surgimento de uma estrela, eu pratico com o conhecimento e vejo que, apesar das baixas, o número de andorinhas que se aventuram a sair da caverna, digo, gaiola, tem sido um pouco maior.
Avoai!!!!!
O que tenho pra fazer no mundo
Uma música angustiada de violência
Uma viagem a pé pelos caminhos
De Roma em busca de solidariedade
Um vôo num dirigível bombardeando
Cidades e exigindo dormir com Geni
Uma casinha na colina com discos
Livros plantas amigos e nada mais
Sexo sexo sexo sexo sexo sexo sexo
A obra teórica mais instigante
Onde vou encontrar minha humanidade
Um suicídio exemplar que nos redima
Até que a hipocrisia nos proteja
Um rock obscuro como a asa da graúna
Falando do big bang e do velho oeste
Seduzir seduzir seduzir
Procurar um par num palheiro sem agulha
Dormir no sereno para medir forças com a lua
Escavar as ruínas pra verificar se fui um gentleman
Escoar as águas passadas para a panela
E fazer uma sopa com a farinha do moinho
Espancar espancar
Partindo do princípio de que o prazer
O verdadeiro prazer está em ser submisso
E verdugo ainda que isso só esteja escrito
na pele dos que desejam o infinito
Lambuzar-me do teu cheiro e gosto ainda
que a noção de civilidade se veja enojada
Pular na cama até que as molas saltem por si
Esquecer que já fui triste porque sou real
Morrermorrermorrermorrermorrermorrer
Sempre intensamente aos jatos e gritos
Desenhando quadros distorcidos com
a própria felicidade fugidia dos membros crispados
Deitar no teu colo num gramado sem formigas
Escutar tua voz enquanto fritamos o peixe
Saber toda história de tuas amigas
Oferecer as entranhas aos Deuses cada vez
Que resolvemos não querer mais encaixar
Minha prepotência na tua intensidade
Tua alegria na minha sapucaídade
Penso logo repito o que tenho pra fazer
No mundo sem a tua proximidade
CAUSO COMPLICADO DE VIDA E MORTE

Se errada estás viva
E certa estarias morta
Então é certo que estejas viva
E errado que estais morta
De tal modo que estando viva
Sejas uma prova de que a morta
Errou ao dar a vida que não deu
E a viva acertou em recusar - se
A matar o que não morreu
Poema para meu filho Thálion Mibielli no seu aniversário de 24 anos (01/06/2015).

Um homem pode se virar
Do avesso e ser sempre
avesso a si
Mas se esse homem de verso
Se torna acima de tudo travesso
Atravessa a rima
e cai pra cima.
VIRGIN

Cultivava seios com o olhar
Mas em sua vida de agricultor
Faltava a materialidade da colheita
Um dia as estrelas virão
Até nós minha amada
E não porque seja madrugada
Ou por que tenhamos
Quebrado a cama no gozo
Mas por que amamos infinito
E infinitamente nos amando
As encontraremos assim por acaso
Como quem passeia nas praças
De mãos dadas e se busca
nos bancos entre beijos e promessas
À propósito de discursos Malfadados e respostas indecorosas de Bons chatos, um poema não antropofágico....

Que minha rola siga voando
Rolando pelos caminhos e sendas
Que sua liberdade criou num risco
Numa risada de crayon à Picasso
E que se encha de gemidos o espaço
Daqueles que se ofendem com seu vôo
E que assim como falo sejam felizes
Aqueles que sabem reconhecer no céu
Num dia de chuva o gozo das nuvens
A bailar entre pássaros e promessas
Porque a felicidade não pode ser somente
meio pau meio cacete
Minto descaradamente diante do espelho
Não quero ver os brancos que o tempo plantou
Em vez disso coloco-os na memória
E o tempo voa e os fatos fogem numa espiral
Agora tenho vinte e cinco anos quero surfar
Viajar pelo caribe no meu jipe azul-burguês
Ou ter vinte e cinco virgens que me deflorem
Pétala por pétala de um bem mal querer
Careço de uma espingarda de matar elefantes
Como as que Hemingway teria
Mas acho que gostaria de não ter a sensibilidade
De sentir as paquidérmicas dores que os dias trazem
Esse negócio de vestir - se do outro
Também é doído que só
Aguda é tudo o que a inteligência se torna
Nesse entra e sai de alteridades
Ou obtusa de tantas peles acumuladas
A ficção dos dias que sou implora por uma pausa
Para acertar a vida refazer o que precisa ser feito
Passar a limpo os borrões e terminar tarefas
Podar rosas talvez fosse bom e justo
Mas acho que acabaria por matar as roseiras
Não adiantaria de nada esse eterno fingimento
Não sou artista dos jardins alheios
Desejo o caos e as manchas disformes
Sem alamedas e simetrias
Meu verso e meu avesso coincidem no infinito
Esse é meu ponto de fuga e minha fugaz alegría
Preciso ser servil e ser algoz
independentemente de convenções
Talvez assim as mãos de que careço
Apesar do meu reflexo deturpado
Conheçam meu endereço
Minha primeira madrugada
Foi assustadoramente branda
E delicada
Sabía - me virgem
E teve o carinho de ouvir
comigo velhas músicas
de fossas que ainda não tinha tido
O locutor da rádio
Um canalha poltrão
As vezes tentava me dissuadir
Vá dormir ele dizia
E minha vontade de ficar
Com a madrugada
só minha
Aumentava
Nem sei direito como me desvencilhei dele
De sua arenga melíflua
Mas nos tornamos amigos enamorados
as madrugadas e eu
Hoje sei
Pândego irremediável
Que me tornei
Que talvez nunca antes
devesse tê-las tido por amantes
E que o locutor que amaldiçoei
Cometera um só pecado
O de pensar que poderia ter me salvado
A modos de Leminski

Furtivas
minhas lágrimas
Foram encontradas
Depenadas
Abandonadas
em beco suspeito
O eco era quase
um trejeito
Variações sobre temas diferentes ( A partir de um poema em prosa publicado hoje por Jaime Brasil Filho)

Estive na guerra de cuidados muitos
nem sei como voltei parindo outros
Sentidos comigo não violão trabalhar
No corpo alheio minhas memórias do fico
Sem dizer que fui eu que disse armado
De terras estranhas a entranhas estradas
Do conluio concluo que aluo em aluguéis
Todos os calvários de tequila e jiló umbigo
Todo mundo é minha semente e somente eu
Não sei semear gente que não gosta de gente
Despejo desalienado meu gozo em desalinho
Recebi uma ordem de desespero espero
Augúrios e almas com guizos
Música de suco de limão espremido
Seu gemido
É quando o sol poente preguiçosamente estica os braços
E abraça a praia fazendo explodir cada gota em luz
Que teu corpo faz juz às curvas das ondas
E as montanhas ao fundo se dobram em reverência
A coisa é assim e não se descreve direito
O sol se põe no mar as cores se multiplicam
E eu sinto vontade de explodir de tanta beleza
A vontade é abraçar o mundo bêbedo
De esperança e alegria
mas mundo não há
O sentimento é maior e as pessoas de que preciso
me fazem falta como as estrelas
Preciso engravidar cada palavra daquilo que realmente é
Mas o minuto passa as horas passam
e fica somente esse sentimento de que tudo é lindo
Tudo é energia coito e gratidão
E que eu por incrível que pareça faço parte disso...
Capitu é quase negra e tem um olhar de esquerda, meio enviesado. Logo, Capitu é petista. Logo, mais, Capitu traiu Bentinho!
Machado, certamente, never more, nos perdoará se não a devolvemos à Havana, de onde nunca deveria ter saído.
E, muito menos, ainda, não será conivente com aqueles que, sendo pais ou professores, não punirem muito severamente àqueles menores, dos dezoito aos dezesseis, que a creditaram inocente. Ou, ainda, mais, que ousaram não se posicionar dentro da dubiedade, ou acreditar na dúvida, ou dizer que não era importante.
Pensaram o que? Que o corpo dela lhe pertencia? Que seu leito podia ser socializado? Que poderia abortar o filho? Que o segredo poderia ser mantido? Que ela independia de Bentinho?!?
Estamos nos dezoito/dezenove e é petismo ou Morte! A outra opção não leva nome de nada, nada crê a não ser no binário. Acaba nada sendo. Mas é.
Prova de que a maçã era, na verdade, uma jaca e a cabeça do pobre Newton foi propositalmente destruída pelo PT. Tava na Vejjja, eu vi.
Shakespeare, pai do pensamento contemporâneo, vaticinou pela boca de Hamleto: - Tupi or not tupi that's the question!
Macunaima, partidário e fundador, respondeu amuado: - Aí que preguiça!
E não se oPTou, até que o pensamento fosse petrificado.
Em dois reside a bênção e a salvação. Só dois salva!!! Três é demais. É muito francês. Nonada.
Você sabia que olhar para trás e ver generais de cinco estrelas, justifica de verdade, o pensamento??
Pensar diferente de tudo, contrariando Quincas Berro D'agua; impossível! Ou se é, ou não.
Capitu também é o boi voador. Olhar de esguelha... Com tetas gigantes de pátria esfarrapada, meio boi mamão, meio vaca de presépio. Farrapos no pensamento, farrapos de independência.
Pária é só a pátria sem tesão. E sem tesão não há solução.
"Porque o sabiá não gosta de palmeiras? Perguntou o menino alviverde, assustado.
Resposta de palavras cruzadas (com as letras contadas perfeitamente): - Você sabia que o sabiá é do PT e sabia assobiar?! Aliás, sabia o sabiá de tudo... Inclusive onde guardava Capitu o seu veneno.
Pois, não foi ela que fez Branca de Neve trair os anões com o príncipe?!? Desejo de poder... Por isso os militares são necessários. Pra acabar com a bagunça, a arruaça, os esquerdos e os direitos. Haverá só Capitu e sua feia traição.
E quem pensa diferente que se mude.
Ame-o e deixe - o... - Aquí e agora, rapazes! Aqui e agora!! Dizia o mainá, entre as folhagens da utopia.
Não criticar Capitu para não dar munição a Bentinho, não criticar Bentinho para não dar carta branca ao PT de Capitu. E não importa se não te satisfaz o torto e o direito. Machado que se f*....
É assim. Na pátria educadora, sabiá só conta até dois...
Você é ou não é, Zé Zé ?
Sempre os mesmos miolos
Massacrados no papel
Até deixarem impressões
Um vulto uma vontade
E meu próprio fantasma
Assombrando minha forma de ser
É verdade então
De nada adiantam a razão e o discernimento
De nada adianta o cimento dos lábios no Beijo
De nada adianta o Tejo ao entardecer
Se não há Pessoas no seu tudo vale a pena
Se não há inimigos a combater com Gentilezas
Se não há as proezas no seu dia a dia
Não há via que o medo não devore
Nem noite em que ele não se arvore
Como uma promessa vil de vida e corredeiras
Porque carpideiras se não há choro nem vela
E porque uma janela num beco
Tudo seco tudo da cor de dentro
E o centro do universo sempre se deslocando
As jandaias declamando Cazuza fazem pensar
O que diabos é um lar
Um lugar reincidente de segurança e paz
Continue a nadar diz a menor das barbatanas
E sinestésicos abraçamos cheiros gostos na pele alheia
Como quem rouba a lua erotizado de poder
Somos vagens
Somos vagens no nosso sono matricial
E embora nada faça sentido
Não ter rumo nem certezas
É o que temos de melhor
não nunca houve mal
em ter nas faces um pouco de sal
Pó sobre pó
Como palavras tecidas de vento
Ergueu-se de si
Inexistente e puro
Lavava - se na liturgia da chuva
Já não estendia as mãos às moedas
Sabia do soslaio alheio
Sem pena
Sem dor
Sem ressentimento
Já fora caminho e pedras soltas
Dessas que aqueles sem pecado jogavam
Das chagas e chacinas de estar vivo
Herdara o saber escuro
De atrás dos olhos
Agora fazia manhãs
Que confeitava de núvens
Imperfeitas e chuvosas
Como o homem jamais poderia ter deixado
De ser
É como se as primaveras
estivessem todas ali as cinquenta
Enfileiradinhas no carrossel
Paradas mas girando
Me olhando atentamente
Talvez esperando pra ver
O que vou fazer diante do muro
Que os anos tentaram erguer
Entre mim e o desejo criança
A vontade é soltar uma a uma
De seus arreios e deixar
Que se abram em flores
Que disparem pelo lavrado
Que sirvam de montaria aos quatro
Ou simplesmente sejam minhas
E vão se reproduzindo e crescendo
Aumentando nosso girar endoidecido
Porque gosto cada vez mais de viver
E de amar
Pára o sempre que quero descer
O sofá está velho
O cachorro está velho e fede
O chão de tacos está solto
E é um perigo para lunáticos
Que vivem no mundo dos livros
O pó da biblioteca ainda é o mesmo
Há décadas e estamos ficando menores
Em nosso heroísmo de salvar cães e gatos
Da rua e dos maltratos da humanidade
Já não fazemos amor na nossa máquina
de moer o mundo herdada de John&Yoko
Já não queimamos os maus espíritos
Inalando suas verdades astrais
Agora somos só expectativa
E silenciamos o medo
Mas sabemos
A felicidade está nas flores
Está no grito dos amantes
Nas músicas que ouvimos juntos
Sorrindo de cumplicidade e memórias
Já dançamos nus na chuva
E ficamos dias a fio no escuro do quarto
Já cozinhamos juntos e bebemos todo o vinho
Trilhamos os caminhos da eternidade agora
E vimos lá fora o nascer do sol e o seu pôr
Temos ranzinices guardadas nos armários
Pros días de chuva e vento
Porque não podemos sair
Com medo dos resfriados
Ainda assim nos damos as mãos
Nas praças dos shoppings
E queremos namorar como na modinha
Que foi feito de nossos piercings
E das paisagens tatuadas em nossos corpos
Do amor correndo livre em nossas veias
Ainda são só ternura e paz
Como nós somos
Como nós fomos
Como ainda seremos
Para sempre
Hoje pari um sonho
E como sou muito afeito ao real
Senti doerem os dentes da alma

O exame pré natal não acusou
Mas o sonho estava virado no ventre
E nem a fórceps queria sair

Era um gordo sonho natalino
De familia burguesa reunida à mesa
E veio me rasgando cada laivo de consciência

Da fome no mundo das bocas desnutridas
Dos refugiados tentando ser gente
Da gente matando sonhos com medo da dor
Da vida das fadas que precisam de quem acredite
Da poesia minha pobre e mirrada amiga flor
Que já havia nascido no asfalto um dia

Então juntei um resto de coragem
E desmaiei trazendo ao mundo
Um sonho bobo
Menor e menos importante que um pedaço de pão
Que um pedaço de chão pra plantar

Mas descobri que meu lugar no mundo é ali
Parideira-homem de sonhos que não posso sustentar só
Mas que entrego com prazer para adoção

Poema em homenagem e resposta ao poema que chamei de "O matador de sonhos" do Poeta Devair Fiorotti publicado hoje à noite.
A Eli Macuxi postou um poema lindo no blog dela hoje. Li, amei e fiquei tão impressionado que fiz uma versão minha... É claro em homenagem a ela e à sua poesia...

Nada vai modificar
O gosto do apelo da pele
O ritmo de amplexos
Que são não são
Muitas formas do desejo
perfurante
Ente no dente
mas
Mais ser
O mais sendo macio
Cicio e aventura
Ao infinito e além
Como um atoleiro
Afundando divinações na carne
Cerne em tudo ao redor
Moedor de mim
Tomo das coisa simples
Teu vestido
Tua cor
Teu cheiro
Meu desejo
É só
E me ponho a navegar
No impossível da tua pele aberta
Desejando explosões e sonhos
Enquanto a minha planeja
A própria e deliciosa destruição
A gente semo unha e carne
Unha dela carne minha
E um dispropósito de língua
Aqui e acolá
A gente fiquemo horas emburrecido
Mais aí um intica cum otro
E dá nessa misturança
Us zóio nus óio
As mão pegada
As coisa junta
E quando vê
mermo ela sendo dotora
I eu tumem
A gente vorta pra roça
Inxada na terra
I pá
E nada que digamos de feio
Muda nossa felicidade
POEMA ÉBRIO

Quantas vezes um poema vai à lua e cai
E em quantas delas o poeta está à bordo
Quantas vezes um poema se distrai
Se deixando engolir pelo torvelinho do dia a dia
Quantos sonhos pode sonhar
E quais ele transforma em pesadelos
Será que apenas da carne dos amantes
Se faz sua materialidade histórica
E ipês e orquídeas não podem ser poemas
Quem disse que uma oração fervorosa
É apenas um pedido egoísta diante do belo
Por que não foi escrito que saber mentir
É saber muito mais sobres as verdades
Não me ameacem com o lirismo da vida
Sei que poetas costumam criar tipos pra si
Ou se deixam seduzir pelo nunca mais
Sei que esta lua e esse conhaque
Me botam comovido mas aos diabos
Não estou aqui para ser rima nem solução
aqui estou porque as manhãs existem
Mesmo depois que as noites insones
Acabaram com toda esperança
Menos a cachaça
A modos de Nelson Rodrigues II
Quando se deitam as palavras
No divã da madrugada
Todo mal do amor é desnudado
Não importa quem procurou
Foi procurado
O mais são unhas gemidos
O paraíso a toda
Desgovernado
A porta está aberta
Amanhaceu escancarada
O silêncio dormiu em casa
E embora os pássaros tentem
A manhã não diz nada novo
A porta ao longe era orifício
Coisa de gente desocupada
Como o vento sem destino
Pedaço de um desejo maior
Uma casa segurança lar
A porta sem barreiras convidava
Insinuava festividades felicidade
Brisa a fazia gemer indo e vindo
De vez em quando alguém havia
Ao encontrá-la cerrada de bater
Ou tocar de leve à campainha
Delicada ou de sopetão
ela dizia entre indistintamente
Ou ficava indiferente selada
Cara de pau que era
Mas não hoje
Hoje amanhecera sem serventia
Porta e vazio
Já que ali ninguém mais passava
Eu quando lua for
Hei de fazer sofrer os amantes
Despejando sobre seus corpos
A força das marés
O desejo irrefreável das ondas
De modo que mesmo extenuados
Não possam parar jamais
Quando eu for lua
O mundo será apenas uivo
E a noite uma espera encerrada
Num barril de carvalho
Até que alguém se embebede
De mim
Quando lua for eu
Farei surrar as esperanças
Para que apenas grilos
cantem de prazer
e seu orgasmo
seja a via láctea
Quando finalmente lua eu for
Em meu quarto minguante
Sustentarei leitoso
todas as bocas que a mim vierem
E mesmo me esvaindo
Farei sonhar às árvores dos charcos
ao amanhecer.
Trouxe na ânfora lua e estrelas
Para bebermos junto com a noite
E era estranho o gosto de estar além
E poder tocá-la como a um piano
Tinha metáforas nos olhos
Magníficas metáforas castanhas
Apaixonadas pela aventura nudez
Em seus perigos de vida e morte
Aliás morrer era um detalhe íntimo
Engastado na concavidade de cada
Gemido e suspiro libertado
Agora o antes será
Diziam os corpos
E cair em si estando no outro
Podia ser crime
Mas também era redenção
Dos muitos universos
Com os quais flertei
Nessa minha poética existência
Confesso envergonhado
Que acordar pássaro
Me excita sobremaneira
E que já fui rezadeira
Contadora de causos
Mas de todas as vidas
Que podia ter tido e imaginei
A mais linda e gloriosa
Seria ser um samba
Não o sambista
Nem o passista na passarela
Mas um samba
assim como a brasileira aquarela
Quando a poesia perdeu o jeito
Chico Buarque foi desfeito
Em plena rua
E as mulheres de Atenas
não puderam mais se representar
Quando a poesia já sem compostura
Escapou à censura
Não havia motivos a desencantar
E o cotidiano de Chanel número cinco
Veio para a rua inversos desaforar
Quando a poesia foi espancada subjugada
A barbárie de colarinho estava passando
E seu desejo suástico
Mastigava cáustico
qualquer possibilidade de modinha
Quando a poesia foi dita comunista
João e Maria já não podiam sonhar
Rotulados amarrados espancados
Pelo não saber de quem preferia
pedir ao pai que afastasse o cálice pra periferia
Quando a poesia já fatigada
Chegou em casa depois do batente
Veio tenente coronel e até general
travestidos de civis sem civilidade
E ela foi empurrada pela amurada
E morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Quando o ano acabou
Uma onda veio até a areia
Beijou - a carinhosamente e se foi
Depois a seguinte e a posterior
E todas uma após outra
Desejaram felicidades à terra
As estrelas que se banhavam ali
Fugiram para o infinito
E se pode até ouvir o lamento
Da lua que tangida pelo vento
Mergulhava nas águas agitadas
Os homens então explodiram
Aquela velha casca com fogo
E nasceu um ano novo
Aprendi que não devo produzir
poesias de caráter sensual ou erótico
Não tanto porque o sexo embora maravilhoso
É efêmero e se consuma em momentos
Mas pelo fato de que quando termina o poema
Sempre dá vontade de fazer mais
Difícil fazer um poema sóbrio
Quando há tantas faces tantos olhos
Nos quais embriagar a alma aventureira
Impossível manter palavras contidas
quando há uma multidão de palavrões
e sentidos almejando liberdade nos lençóis
Um desejar trôpego denuncia
As vontades mal escondidas na boca
Que remói outros lábios à distância
Já não se precisa de voz
quando é possível atender grunhidos
E os corpos se tornam todo ouvidos
De tanto amar o mar
Omar chamou
ao primeiro filho
Quando o mar chamou
O primeiro filho
Ele ficou olhando ondas
Incrédulo e traído
Catapultem - me
Pulcra alma
Da lama criada
No charco atolado
Até os cheiros
Retirem - me os freios
Que os rôo incessantemente
Façam - me gente
Comida e líquidos
Depois devolvam - me
aos céus cometam-me
Uma gota escorrendo
O que estás querendo
Pergunta pele arrepiada
Mas a gota malvada
Segue descendo
Em cada cantinho
Deixando uma estrada
E a dona da pele
Vai ficando molhada
POESIA IMPROVÁVEL DE CARNAVAL
A bezerra morreu no cio da repressão
Não brincava carnaval nem dizia sim nem não
A bezerra vivia sua necessidade de ser pura
A pureza gritava dentro dela querendo
O jorrar de suas tetas nas bocas dos foliões
A bezerra tinha tensão nos bicos dos úberes
O bumbo fazia seu coração saltar
Empurrando tudo mais pra fora do altar
Que era sua carne quase suína de desejo
Mas ela mazela sua negava o beijo do asfalto
Negava o salto da vitela para o espeto
Negava papo reto de couro estendido
Negava ao ouvido os elogios à sua composição
Olhava tudo aquilo como estouro da boiada
Sentia-se deslocada os quartos balançando
No máximo se permitia amaciar o filé mignon
Morreu na mão do megarefe matador
Novilha da silva sem nunca ter vaca sido
E nós choramos sua morte
Bezerra volte
Poesia de auto ajuda
Valei - me são eu mesmo
Vá ler - me no espelho
Onde sou lindo maravilhoso
E gozo de vinte anos menos
Valei-me com catuaba e ovos de codorna
Nas sarjetas obscuras
E outros vales e valas
Nos quais procuro afundar minhalma
No orgasmo cósmico indistinto
Valei-me nas palavras de honra e segurança
E nós ouvidos da madrugada
Ammarrado a você e à cama
De onde sonho com um mundo melhor
Cheio de mim seu umbigo
E da ajuda da minha lúdica loucura
Ói eu brincando com teu poema e com o Drummond Eli....
Margarina sem pão lamentava - se
Chorava o fato da cena do último tango
Ter sido feita toda com manteiga
Amarga vida sua artificiosa condição
Não ter leite na composição
E ser menos glamurosa
Assim meio derretida meio acabada
Cedeu seu pote para terra e semente
Ali como no asfalto nasceu delicada flor
Uma margarida minha gente
Poema feito para um poema da Eli Macuxi no seu blog www.elimacuxi.blogspot.com ( poesia pura)
Dos sonhos repartimos a carne
E nos encontramos no fundo afogados
Em nossas próprias deserções dos mitos
Por ali fomos mais bonitos e escassos
Sem fracassos nem acertos
Permanecemos abertos
Sem tetos sem tretas sem tecidos a mais
Partimos do cais para a tempestade
Desarvorados as velas esfarrapadas
Ainda trocamos tiros na madrugada
Como dois bucaneiros
Arruaceiros das coisas do lar
Invadimos sofá e geladeira
Não respeitamos nem a namoradeira
Na varanda invadimos os ouvidos alheios
E feios como nossos gritos
Concluímos aflitos que a humanidade
Não está preparada para acordar nua
E de prazer perfumada em plena rua
Hoje não quero ameaçar
O amanhecer com nosso cio
Quero um pão com manteiga
Uma xícara de café e as chinelas
Que guardo no armário
para os dias de ócio
quando faz frio nos ossos
Hoje não quero sorrir olhando
No espelho sua assinatura vermelha
em cada canto meu
Quero ouvir música de bandoneon
E ligar simultaneamente a tevê
Bem alto
pra substituir a falta dos nossos gemidos
Hoje não posso respirar seu sabor
Ou colher seu perfume na roupa por lavar
Nem ser seu eternamente
E nem até mesmo embaixo d'água
Porque você já foi embora
E sua ausência
faz escuro em mim
Não é justo encarar a madrugada
Quando ela faz aquela cara feia
De bem feito você está sozinho
E relembra de um tempo menos cruel
Em que ela e os cigarros andavam juntos
Assim como as cigarras e o pôr do sol
A tosse vai impelindo a memória
E você se descobre sorrindo
Estar só ainda é estar
Alienijo-me de mim em teu ser
Somos gestos e sombras no infinito
A olho nu nos encaramos
Corpos celestes girando
Poeira de estrelas que dança o bolero
Em nós cada dimensão
Tem seu próprio desejo
Universos paralelos
eternamente em expansão
Negros na negritude dos becos do corpo
Ameaçamos o falso moralismo esbranquiçado
Alguns de nós trazem um arco íris desfraldado
Nas entranhas como se bebessem o suor alheio
Re evolucionamos nossas preces
Garantindo a segurança dos que nos têm ofendido
E nos deixamos cair em tentação
Navegando no sangue do compadrio
Pois que no frio mesclamos
Nossas peles, pelos e apelos
Criamos elos que não serão desfeitos
Para o bem ou para o mal
Por isso somos e fomos carnaval
PEDAGOGIA DO ERRO
Erre
Erre muito e sempre
Erre por Bruxelas
Pelos becos de Paris
Pelos canais de Veneza
Erre sem nunca acertar
Sem nunca se quedar
Insatisfeito imperfeito humano
Erre de barriga cheia
Ou de barriga vazia por um pão
A mão estendida suplicando
Erre amando
Cada curva cada delícia do caminho
Erre sozinho
Entre lágrimas e sorrisos vãos
Que não serão vistos
Entre bem quistos bem apessoados
Erre entre os humilhados e ofendidos
Nos precipícios
Não há erro
Tudo desce e cai por terra
E todo sólido se desmancha no ar
Erre com as dúvidas
Machado sabia
Duvidar é do ser
Erre com os filhos
Com os filhos dos filhos
Acerte bolinhas de papel
Erre nas provas da vida
Cada questão de marcar xis
Erre na mesmice
E finalmente quando muito tiver errado
Continue errando
Para o alto e além
Livre das certezas
Livre do incômodo do politicamente correto

31 de janeiro de 2015

Poema do desespero existencial

Porque ser
Se você
Pode star
E se acordasse um belo dia
Descobrisse que não sou o protagonista
Que tudo o que minha vista
Alcança é pouco para que esta ficção
Tenha um mínimo de verosimilhança

E que minha herança é o pó
Das palavras que o vento desuniu

Se percebesse naquele segundo
Que o mundo continua depois
E que era coadjuvante na história
Da pessoa mais insignificante

Onde esconderia meus sonhos
de glória e orgasmos volumosos
Que guardei com carinho

Em que escaninho mesquinho
Seria guardado meu ego
Para jamais ser estudado

Valeria a pena ter pensado
Tanto tanto ter lutado

Não teria sido melhor ser
Ave que morre de pedrada
Esquecida olvidada

Algo que passou
um ser breve
que não vai voltar
Não quer voltar
Não pode voltar

Apenas porque não é preciso
Que nada faça sentido
Nem tenha importância
Para o tempo em que se viveu

Nem mesmo eu
Como se tentasse evitar uma tragédia
Abocanhou forte o bico vermelho
Espalmou a mão no rosto branco
E xingou tanto quanto pode
invadiu mais do que de costume
Em movimentos assustadoramente intensos
Queria rachá-la ao meio antes que acontecesse

Pois sabia que quando ela experimentasse
A vida loca nunca mais teria fim
Estou aqui onde as farpas
Da cerca estilhaçam o sol
Onde os cem anos de solidão
Concentrados numa única
Gota escorrem para o paraíso
Dos dias para as terras do fim
E alagam a memoria com
O gozo sujo da desesperança

Estou aqui olhando o cosmo pelo avesso
Tão concentrado em um só espinho
Que não interessa mesmo a quantidade
De feridas que ele pode ter aberto na brisa
caminho dos cegos e das mariposas

Estou aqui entre palavras e linhas
De um destino que não reconheço
Como meu nem pretendo ver na borra
Do café de ninguém que mereça desprezo
Miro a lua com os olhos insones
Sugando sua forma pouco a pouco
Queria um blues e um cigarro
mas é clichê sonhar com facilidades

Ainda agora anoiteci meus medos
Com uma cantiga de ninar nada original
Acariciando o vazio como se fosse eternidade
Começou na ponta dos dedos
Era engraçado sensual sei lá
Depois avançou pelos braços e pernas
Bom bom bom muuuito boooom
Os pelos eriçados flutuavam
Sem carne sem pouso sem destino
Aos poucos o circulo foi se fechando
Os mamilos querendo se ejetar
As pernas abrindo o caminho de si
Até que se aprofundou de repente
Vezes sem conta abruptamente

E a alma sem dono vagou por aí
(Por mais óbvio que pareça o título é esse mesmo) PERDAS &GANHOS

Tenho perdido muito ao longo da vida
Perdi coisas que se perderam de mim
Perdi assim dinheiro pela falta de zelo
Perdi o elo com imagens que teria guardado
Perdi o agrado de amigos e amantes
Perdi mesmo antes de ter tido a glória
E da história também me vi perdido
Perdi os sentidos com o fim de segredos
E meus medos foram aos poucos dissipados
Não tenho achado mais minhas anotações
E as ações que deveria ter realizado
Do meu lado quedam irremediavelmente perdidas
Das vidas que poderia ter vivido não há o que falar
E não encontro lugar de descanso que me cure
Não me jure que as promessas infinitas
São as mais bonitas pois nem sempre se cumprem

Peço que não soprem mais velas no meu bolo
Porque o rolo compressor aumenta o desvio
E quanto mais se consome o pavio mais fumaça
O mundo espaça e em sonhos abandona e dispersa
Tenho perdido à beça a pura noção da decência
E sofro da inconveniência de gostar de sexo
Não vejo muito nexo em perder o já perdido
Mas mesmo isso tem me acontecido em escala
Há quem cala e perde a chance de me dizer
Que seu viver independe de mim e de minha felicidade
Mas considero maldade os que falam sem nada dizer
Dos de prazer fingido tenho me despido ou achado em poesia
E não é todo dia que não lembro do que fui e sou
Aliás do pouco que restou faço duas propostas
Ou me sai das costas me olvidando definitivamente a morte
Ou me corte da vida e da memória a mãe do esquecimento
Este é meu testamento
Era bela como a noite
Acoitava corações como ninguém
Mesmo quando morria nos braços
Do infinito e mordia a pele do desejo

Falava a língua oculta da imensidão
Dentro dos que choravam seu prazer
Sem procurar entender mágoas e medos
Sem comportar os dedos e as mentiras
E terminava em tiras
o que não tinha começado

Seu maior pecado
Era amar demais
Por isso vivia gozos mortais
Das delícias dos reencontros
Conquistei a quimera dos anos
Reaprendi minhas virgindades
E noites insones fizeram
Ver que tudo é diferente
Muito embora não haja novidades
Entre céus e terra

É só uma questão de ir além da pele
Lá onde o querer é mais profundo
E não tem dono
É um atropelar de conceitos
Em busca do abandono
Magia que transforma
o demonio da culpa
Em plenitude da felicidade

Sim sonhei acordado
E vi de cada lado um anjo
A me dizer da saudade
A me provocar as minúcias do olhar
No coito das núpcias com o tempo
Agora sei encontrar as distâncias
Tanto quanto as proximidades
E sei que sempre valerá a pena amar
Ainda que num quase eterno esperar
Desejo é coisa de quem quer
Não é só coisa de homem e mulher
É coisa de flor que se oferece
Ao sol e ao beija-flor que passa
É coisa da água essa devassa
Que a todos sacia e que deseja o mar
É como querer ter um lugar
Para receber amigos e parentes
É como beijos de crianças inocentes
Que só desejam dar às gentes felicidade
É essa vontade louca de abraçar o mundo
E dizer a qualquer um mesmo num segundo
Que viver é lindo e sempre há esperança
Por mais ridículo e piegas que pareça
Desejo é coisa da cabeça
mas também é do corpo que dança
Dos dedos que tamborilam da voz desafinada
Das coisas escondidas mesmo as que todos sabem
Desejo é polissêmico polifônico tudo e todos cabem
Até o da moça tímida de ser perdida e encontrada
Desejos às vezes são mesquinhos pequenininhos
Chegam a ser engraçados
Dominar a lua ter todos os três porquinhos
Fazer pequenas maldades ou ser vitimado
Conquistar a grande montanha do El dorado
Ler as bibliotecas da Alexandria e do vaticano
Ser o cara da vez e nunca entrar pelo cano
Desejo é vida e também libido
Desejo pode ser indefinido
feliz
especial
Alegre
Triste
Abranger tudo e nada
Tem desejo que ainda nem existe
Tem desejo que se renova
E que por isso prova
Que algo é desejado o tempo todo
Através das horas dias meses anos
Enganos
Aliás passei pra dizer que desejo a meu modo
O seu desejo

Que tenhas um ótimo Ano novo e que o desejo prova do genio da insatisfação e da inquietude humanas seja ainda mais forte pra ti em 2015
E que de vez em quando quando for bom e oportuno cumpra-se
Quero você subindo meus muros
Por todos os lados como horda
De arrepios invadindo a fortaleza
Da pele arrancando das prisões
Nos porões mais alagados as vontades

Criando tempestades onde só havia
Uma tímida umidade no ar e na terra
Quero ouvir as imprecações dos piratas
Sentir a força dos ganchos dominando
Fazendo em cacos civilidade e vergonha

Transformando minha solidão em abismo
Os urros e sussurros na música da criação
o universo nas pequenas gotas de suor
E o caos em nós pontas da mesma corda

Acordo do patético com a poesia dos tons
Tatuagem dos sons no corpo da noite
Açoite de sinceridades do paladar
Esconderijo da língua no gosto que tenho

Para seu prazer porque sei que seu exército
precisa beber precisa lutar abrir caminhos
Arrebentar resistências extrair saquear
Se embebedar com meus vinhos
Coloque uma gaivota
no seu por do sol por mim
É que gosto de comerciais
De gente correndo na areia
E penso que Fernão Capelo
Embora triste era livre

O sol se pondo no mar é tão colorido
que consegue transformar em alegria
A distância como se ela não existisse
E ele e a água estivessem no mesmo lugar
Aprofundando-se um no outro até as estrelas
É por isso talvez que elas existam lá e cá
Trazidas pelas gaivotas
Prova de que em matéria de amor impossível não há
Para termos uma conversa sem fim
Coloquei você em mim entre parêntesis
As frases dos destinos cruzados
Entrecortadas de aventura sofreguidão
Assim cada pequeno trecho da minha pele
Quando combinado com a sua
Fez o universo ser mais único mais verso
Já vivi na eternidade do olhar
Tantos beijos não dados
Que acho que os fados
Têm razão

A vida é só ilusão
Da primeira vez que a beleza foi às estrelas
Teve medo da altura e precisou voltar
Para isso teve que inventar o raio de luar

Da segunda vez que ela ousou se aventurar
Ficou presa do seu sorriso no exato momento
Em que você quase saciada se deixava derramar

Mas houve ainda outro genial instante
além do mito e do prazer e tão importante
Foi quando usando de toda sua magia
A beleza se transformou em poesia
Deixe estar a chaleira no fogo
Deixe que as coisas queimem
E que a poeira se alastre
Só nos dois temos direito
De nos movermos antes
E depois do universo
Só nós dois sabemos o gosto
Que nossos corpos têm
No corpo da madrugada

Deixe estar essa preocupação
Com a eternidade do amor
Refugie seus medos e razão
na efemeridade do gozo
Sem a qual não haveria o sem fim
Deite em mim os dentes e unhas
A realidade é só o que temos
Para agarrar e narrar
Enquanto não aparecem os netos

Deixe - se finalmente encantar
Com as cotovias da alvorada
Se nossa vida nos for proibida
Temos nossas marcas e cheiros
Busquemos ainda festeiros
Este pequeno morrer
As coisas que giram ao redor
Terão o valor da memória
E dançaremos sempre com as estrelas
Você não sabe talvez
Que minha vida
Fica só ida sem você

Fica sem o vê
De suas pernas
Em vitória

Esquece da glória
De fazer perder
O tino e a razão

Não sabe que não
Sei sabor saber
Se não for seu prazer

Que não sei fazer nada
Não quero outra sorte
Embora me faça forte

Fico sem eira nem beira
inda que alguem
Sem querer me queira

Deveria saber então
Que minha vida também
Fica sem ida sem você

Fica sem porquê
Sem caminho ou escolta
Porquê você não volta

13 de maio de 2014

Poendo o horizonte
O velho e gordo sol
Despenca hilariante
detrás das montanhas

O gato da Alice então
Vem pra o concerto
Das estrelas e ouvindo
Grilos e cigarras vai
Limpando o céu da confusão
Que o desastrado astro deixou
Será que sou só eu
que procuro com o olhar
irrequieto no âmago da noite
A parte de mim que ainda
Não me pertence

Será que apenas mim
Vive assim meio desnorteado
Procurando pelos lados
Um ponto de fuga
Um circo de pulgas
Onde exibir minhas
habilidades caninas

Será que apenas meu olhar
Vagueia erigindo mitos
E metas onde se meta
Minha finalidade e onde
Finde nossa normalidade

Quem sabe aonde leva a noite
Aonde vão os inocentes
Depois que sua inocência
Se torna um empecilho
Para que brilhe o luar

Quero navegar tuas letras
Circundar tuas retas
com o texto das promessas
Que ainda posso fazer

colha o sol com teus seios
sejamos feios apenas
E que nos vejam nus
Esquecidos da civilização

Com a parceria luxuosa e sublime de Eli Macuxi
Se mais vermelha a paixão fora
Qual tora em brasa estalando
Não ficarias no firmamento deambulando
e te consumirias como quem na treva chora

Assim é que talvez não se demora
E alguém mais ajuizado profere misto
de juramento e maldição
Se agora padeces do fogo de Mefisto
É porque de amor ou de tesão
Todo mundo é sem noção

30 de abril de 2014

E La nave vá

crepúsculo palavra que mói o sol
sucessão de coloridos dentes cravados
no ocaso lugar em que ele se perdeu
ao acaso entre o horizonte e o beleléu
ou virou por-do-sol processo de ovular-se
por-se para renascer chocando a manhã
como poente memória que permanece
no sufixo ente como um constante
fim de tarde momento em que tudo
arde e em que Nero faz algum sentido
fazendo de Roma e outros rumos a fogueira
que ilumina o anoitecer no qual e somente
ali o medo assume os mais variados tons

27 de abril de 2014

Eu,
quando não amo,
gamo!
Café com humildade
Preto e pobre
Pão com margarina
Dessas que faz lembrar
Que somos supostamente
Civilizados
E uma manhã cheia de
expectativas gostos e lembranças
De quando eu era mais simples
De quando sabia dos meus pecados

Quando foi que eu saí
da terra do nunca
Refazer os passos
Até repisar a sorte
Equívoco dos que se encontram
Medo dos que nunca se perderam
De nada nem por ninguém

Refazer os passos na areia das ampulhetas
Como se o tempo esse deserto
De esperanças pudesse perdoar
Os incautos de suas velhas dívidas

Refazer os passos com os pés de barro
No barro vermelho do caminho
Até ir virando a poeira cor de sangue
que fecunda e recobre a memória

Poema do desespero existencial

Porque ser
Se você
Pode star
Pernas pra que te quero
Clero das danças e andanças
Pelo país dos desejos
Penas dos beijos que caminham pelo corpo
Sopro de sim que vem com o não
Razão inversa à questão de ser
Ou não ser quando se quer
Colher com a qual se devora
O agora do teu sorriso
gozo das palavras
Escravas que são da nossa paixão
Sensação de mescla e gosto
Posto e aposto no modo de dizer
Querer de andanças infinitas
Aflitas vontades na pista
Passista da minha pele
Ser que me revele em si desconexo
Reflexo de querer andar à tonta
Escolta dos meus muitos eus
Perdidos nos teus devaneios
Seios intumescidos de luares
Lugares em tua tarde onde me escondo
Macondo na solidão do teu caminho
Tantinho de dor que dá prazer
Entender com quantas promessas se faz um ninho
Vinho das bodas de sangue
Gangue de unhas nas costas
Piratas saqueando gemidos
Ouvidos invadidos de blasfêmia
Fêmea do chicote a voz brinca
Finca os dentes derrotando pudícias
Milícias dos dedos patrulhando desvãos
Sãos os pelos se erguem e gritam
Imitam o querer das pernas se desvanescendo
Remendo de núvens para cobrir o sol
Que explodindo se põe
Escavar no outro o paraíso
Indeciso quanto à própria sorte
Depositar-se em maçãs e meias verdades
Fugir em busca da imperfeição dos teus gritos
Tornar-se mortal um pouco de cada vez
Temer a tez desnuda que encarcera
Sucumbir à tortura de ser o algoz
Deixar-se levar à truz unha e boca
à borda da felicidade de precipitar-nos
Entender que todo édem é renovável
À carícias
E se acordasse um belo dia
Descobrisse que não sou o protagonista
Que tudo o que minha vista
Alcança é pouco para que esta ficção
Tenha um mínimo de verosimilhança

E que minha herança é o pó
Das palavras que o vento desuniu

Se percebesse naquele segundo
Que o mundo continua depois
E que era coadjuvante na história
Da pessoa mais insignificante

Onde esconderia meus sonhos
de glória e orgasmos volumosos
Que guardei com carinho

Em que escaninho mesquinho
Seria guardado meu ego
Para jamais ser estudado

Valeria a pena ter pensado
Tanto tanto ter lutado

Não teria sido melhor ser
Ave que morre de pedrada
Esquecida olvidada

Algo que passou
um ser breve
que não vai voltar
Não quer voltar
Não pode voltar

Apenas porque não é preciso
Que nada faça sentido
Nem tenha importância
Para o tempo em que se viveu

Nem mesmo eu
Inominável ronrona serena
Como quem não quer nada
Insinua os bigodes gatunos
E a cabeça coça por dentro

As idéias paradinhas quietas
Organizadas num canto
Proibidas de fazer algazarra
Enquanto algo cicia espanto

Nada de pomposo e grande
Um fiozinho teimoso meio
Pavio meio teia tecida com
O não saber o que fazer de si

Uma quase tontura leve e sem graça
De ser você mesmo e ter que caber
Todo dentro de seu ser anterior
Quando se é infimamente maior

Um estranho apalpando seio
Tentando ver concretamente
O proibido banalizado doente
Necessidade de respostas

Para o não ser
Só esta agonia
A tristeza de crer
E duvidar

15 de março de 2014

Preciso ser menos do que sou
E fazer amigos em cada bar
Preciso dizer que não amo
A mulher das pernas perfeitas
Mas aquela outra improvável
Que entende meu delirio e minha maldição
Preciso escrever na testa que não quero
Nada nem ninguém no meu encalço
E que preciso ser meu de vez em quando
Preciso dizer que ando apaixonado
Por alguém que nem conheço
E que peço aos céus que me desconheça
Também
Preciso estar além
De fato não sei como é a do parto
pois minha condição masculina me impede
Faço uma vaga ideia de como são as cólicas
que dizem ser a segunda maior
depois da concepção
Mas permitam-me discordar
Explicando minha questão

Aquela de perder
a quem se ama
É a pior
Pois não há cura
Não há o que estancar
costurar ou arrancar
Nem o que preencha o vazio
Quando ele dói
quando teu coração pedra for
não duvide da dor que é ser humano
não duvide do engano de uma paixão
não duvide da razão que faz acreditar
não duvide que meu lar foi teu corpo
e que meu sopro de vida foi o mesmo ar
onde teve lugar nosso perfume
o que nos resume a um só e ao mesmo
em que a esmo imagens ficaram marcadas
não faça pouco das fadas cujo encanto
nos retirou o manto e nos fez brincar
a ciranda do par e dos gozos momentâneos
preservada em instantâneos em movimento
alento para os dias de pouca memória
história que virou pó e o vento espalhou
e que se voltou contra nossa vida
e revelou o belo e o triste da relação
por isso quando teu coração pedra virar
procure não hesitar atire o primeiro amor
Em meio aos meus sonhos
Tem aquele em que tua boca
Se adona da minha teu corpo
se ocupa do meu e viver
Se torna tão simples quanto respirar

O problema é esse eterno acordar

redoneto

aprendi com as palavras
a me tornar ligeiramente
divergente do que quero dizer
a me enternecer com o vazio
a sentir frio quando há calor
a bajular o amor mesmo quando
ele esquece de existir

aprendi com as palavras
que estamos todos grávidos
em algum momento
de algo que é do outro
e que não existe repulsa maior
que esquecer o quanto
é singular a primeira pessoa

aprendi com a palavra árvore
a me contorcer por um nada de sol
e a me manter ereto mesmo
nas grandes tempestades

mas no fundo nunca soube
o que as palavras podem
me dizer de igual sem
que haja igualdade
caso com você
Todos os dias que você quiser

E nos que não me aceitar
Me caso com seu lugar
No mundo com seus amigos
Seus dias chuvosos
Com os escravos desses
Seus olhos vadios
Com os navios que sua voz
Naufragou sabendo que
era preciso navegar

Caso com seu (a)mar
me desamando com
a brutalidade do seu carinho
Com seu caminho tão felino
E independente

Caso com seus dias pré
com sua pós suas teses
E te(n)sões

Caso com os senões das nossas discordâncias
E com as errâncias da sua pele
Em mãos estranhas e tempos distintos

Caso com o que meu corpo
não sabe das suas experiências
com as rugas que surgirão

Caso com sua mão
E com a história que ela sonhou
E realizou