Não havia nas bocas
Nada senão bocas
Bocas que outras bocas
Já tinham abocanhado
Bocas trancadas no calabouço
De si
vorazmente engalfinhadas
Bocas crescendo
Disputando
Engolindo cada pedaço
Do outro
Numa antropofagia
Desesperada
Apressada
Quase mórbida
Pareciam ventosas grudando-se
Sustentando os aventureiros
No teto do quarto
Em pouco tempo
não havia mais nada
nem braços
nem pernas
nem cores
nem nomes
apenas bocas
insaciáveis
lascivas
e o beijo.
8 comentários:
Lindo poema... Esse eu não conhecia. Meio Klint (uma antrofagia delicada), mas muito Rodin tb (não só dos beijos, mas dos Ugolinos da vida). Perfeito, principalmente nesse andrógino que se funde com o outro, o aniquila, feito só de bocas (caladas, o que é melhor), e que ainda parece faminto no final. Parabéns.
Obrigado Mirella, visto assim com olhos tão academicamente belos (verdes) e tão certeiros, me sinto "importante" como poeta. E fico orgulhoso do que fiz, espero que não tenha sido apenas benevolência sua. Apareça mais, sua presença (e principalmente sua crítica) é sempre muitíssimo bem-vinda. Bjs!
Mibi, meu amigo, estás em Roraima? Deve ser linda essa terra! Quando eu conseguir um ano sabático (ah, sonho!)farei da minha vida um andar por esse país e com certeza chego aí. Saudade amigo! Sabia que eu não conhecia a sua poesia? A-m-e-i!!! Parabéns! Abs
Raquel
Roberto, não gostei deste poema. A repetição da palavra boca empobrece teu texto e "bocas que outras bocas já tinham abocanhado" lembra a merda que Pessoa escreveu: "Basta o bastante de bastar-se" (ou algo próximo a isso) Entendo que a ideia das bilabias aqui poderiam ser exploradas de maneira mais original. Ponto.
charles, como você sabe (e provocantemente questiona sempre)adoro Pessoa e adoro brincar com a sonoridade, mas acho que vc tem razão quando diz que o poema é repetitivo. Isso talvez canse o leitor, mas a intenção era de intensidade, de bocas sobrepondo-se até a exaustão... bocas em cascata de modo a causar uma inflação delas. O efeito foi alcançado, mas talvez a custa da beleza do poema... não sei. Achei que tinha conseguido algo bom. Quem sabe num próximo...
Penso que Fernando Pessoa foi o maior poeta que apareceu na literatura universal (ou açúcar). Quando jovem tive fôlego para ler suas obras completas, prosa e verso. Amei quase tudo que li. Mas lembro de versos que não digeri muito bem. O que estou tentando dizer é que os grandes também cometem deslizes, contradições, efeitos infelizes. Pessoa não passou incólume por essas crises.
Oi, Mibi! Em mim, seu poema faz sentido... A sonoridade combina exatamente com a intenção pretendida. Semanticamente, ñ havia c/ ser d outra forma e, nesse caso, vejo a repetição como necessária. Considere-se feliz: vou levá-lo para a sala tb! Ponto.
Obrigado, Sheila. É bom saber que meus poemas causam diferentes sensações (e polêmicas). É melhor ainda saber que eles vão para a sala de aula de alguém. espero, algum dia, ver algo de seu publicado por aqui... seja no modo de poesia, seja de crítica..
Beijo,
Mibi
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