31 de agosto de 2005

mais algumas

Trabalho no teu corpo
com rabiscos
e riscos de fúria
uterina leveza
desta flor
em despetalamento

Trabalho no teu corpo
com o delírio da unha
com a língua em cunha
com paixão e desfalecimento

_________________________________

teu corpo diz coisas
de um jeito
que as palavras
não têm direito
de dizer.

___________________________________

Acima do bem e do mal
O Rio de Janeiro
Deságua em Fevereiro

É carnaval...

alguma poesia...

Espaço incógnito
Nomes de praças e ruas
Até o umbigo

Depois rota única
O campo

(fondue -2005)
______________________________________




Função/ões da linguagem
Necessidade de dizer coisas:
Os navios não encalham
na lua cheia

não é a maré
(nem a visibilidade que melhora)
é a distância
que é grande mesmo

_________________________________


Pêlos e mergulho
Nunca voltar à tona
Nunca morrer de verdade

(fondue - 2005)
_________________________________


Anamorfose


Condições sine qua non
Para poder estar aqui com você

Não estar cá com os meus botões
A matutar na morte do Bezerra;

Não ter ido ao enterro, nem ao velório
Porque ele pode ter morrido tarde
As festas fúnebres costumam
Entrar noite adentro

Não aceitar um provável pedido
da possível mãe pra conduzir
o féretro e as cerimônias que
podem estar acontecendo agora;

Não ter nunca sequer conhecido
o Bezerra, nem os seus,
pois teria remorsos
e isso não combinaria
com os sons da tua pele;

Ter podido retirar o dinheiro
No caixa eletrônico
Pra pagar o motel e a bebida cara
Se o Bezerra tivesse
Chegado no banco pra depositar
antes do infarto


____________________________________



Quando nos vemos
Repartimos tudo
Inclusive as horas

Por isso o tempo voa


________________________________________


Vi uma boneca de plástico
Jogada fora,
num rio de uma favela em São Gonçalo
Perfeito bebê boneca atirada
Abandonada
Boiando no dia seguinte
Ao dia das crianças
Num lugar onde quase ninguém
Ganhou nada

Estaria morta?

(manequins - 2004)
_______________________________________________



Difícil não falar do plástico
Nos corpos ali derramados
Entre a valeta a loja
E as marcas da violência
Já quase marrons no muro

O vestido da noiva rasgado
Em diversos tons de lama

O dia a dia continua
E juntar trapos
Não mais surpreende
Em época de enchente

(manequins -2004)



__________________________________________


Nutrir o caos com leite do peito
Até aos seis meses
É possível para ambos os sexos
E propõe um futuro
Absolutamente sem garantias


(maternidades - 2005)