30 de abril de 2014

E La nave vá

crepúsculo palavra que mói o sol
sucessão de coloridos dentes cravados
no ocaso lugar em que ele se perdeu
ao acaso entre o horizonte e o beleléu
ou virou por-do-sol processo de ovular-se
por-se para renascer chocando a manhã
como poente memória que permanece
no sufixo ente como um constante
fim de tarde momento em que tudo
arde e em que Nero faz algum sentido
fazendo de Roma e outros rumos a fogueira
que ilumina o anoitecer no qual e somente
ali o medo assume os mais variados tons

27 de abril de 2014

Eu,
quando não amo,
gamo!
Café com humildade
Preto e pobre
Pão com margarina
Dessas que faz lembrar
Que somos supostamente
Civilizados
E uma manhã cheia de
expectativas gostos e lembranças
De quando eu era mais simples
De quando sabia dos meus pecados

Quando foi que eu saí
da terra do nunca
Refazer os passos
Até repisar a sorte
Equívoco dos que se encontram
Medo dos que nunca se perderam
De nada nem por ninguém

Refazer os passos na areia das ampulhetas
Como se o tempo esse deserto
De esperanças pudesse perdoar
Os incautos de suas velhas dívidas

Refazer os passos com os pés de barro
No barro vermelho do caminho
Até ir virando a poeira cor de sangue
que fecunda e recobre a memória

Poema do desespero existencial

Porque ser
Se você
Pode star
Pernas pra que te quero
Clero das danças e andanças
Pelo país dos desejos
Penas dos beijos que caminham pelo corpo
Sopro de sim que vem com o não
Razão inversa à questão de ser
Ou não ser quando se quer
Colher com a qual se devora
O agora do teu sorriso
gozo das palavras
Escravas que são da nossa paixão
Sensação de mescla e gosto
Posto e aposto no modo de dizer
Querer de andanças infinitas
Aflitas vontades na pista
Passista da minha pele
Ser que me revele em si desconexo
Reflexo de querer andar à tonta
Escolta dos meus muitos eus
Perdidos nos teus devaneios
Seios intumescidos de luares
Lugares em tua tarde onde me escondo
Macondo na solidão do teu caminho
Tantinho de dor que dá prazer
Entender com quantas promessas se faz um ninho
Vinho das bodas de sangue
Gangue de unhas nas costas
Piratas saqueando gemidos
Ouvidos invadidos de blasfêmia
Fêmea do chicote a voz brinca
Finca os dentes derrotando pudícias
Milícias dos dedos patrulhando desvãos
Sãos os pelos se erguem e gritam
Imitam o querer das pernas se desvanescendo
Remendo de núvens para cobrir o sol
Que explodindo se põe
Escavar no outro o paraíso
Indeciso quanto à própria sorte
Depositar-se em maçãs e meias verdades
Fugir em busca da imperfeição dos teus gritos
Tornar-se mortal um pouco de cada vez
Temer a tez desnuda que encarcera
Sucumbir à tortura de ser o algoz
Deixar-se levar à truz unha e boca
à borda da felicidade de precipitar-nos
Entender que todo édem é renovável
À carícias
E se acordasse um belo dia
Descobrisse que não sou o protagonista
Que tudo o que minha vista
Alcança é pouco para que esta ficção
Tenha um mínimo de verosimilhança

E que minha herança é o pó
Das palavras que o vento desuniu

Se percebesse naquele segundo
Que o mundo continua depois
E que era coadjuvante na história
Da pessoa mais insignificante

Onde esconderia meus sonhos
de glória e orgasmos volumosos
Que guardei com carinho

Em que escaninho mesquinho
Seria guardado meu ego
Para jamais ser estudado

Valeria a pena ter pensado
Tanto tanto ter lutado

Não teria sido melhor ser
Ave que morre de pedrada
Esquecida olvidada

Algo que passou
um ser breve
que não vai voltar
Não quer voltar
Não pode voltar

Apenas porque não é preciso
Que nada faça sentido
Nem tenha importância
Para o tempo em que se viveu

Nem mesmo eu
Inominável ronrona serena
Como quem não quer nada
Insinua os bigodes gatunos
E a cabeça coça por dentro

As idéias paradinhas quietas
Organizadas num canto
Proibidas de fazer algazarra
Enquanto algo cicia espanto

Nada de pomposo e grande
Um fiozinho teimoso meio
Pavio meio teia tecida com
O não saber o que fazer de si

Uma quase tontura leve e sem graça
De ser você mesmo e ter que caber
Todo dentro de seu ser anterior
Quando se é infimamente maior

Um estranho apalpando seio
Tentando ver concretamente
O proibido banalizado doente
Necessidade de respostas

Para o não ser
Só esta agonia
A tristeza de crer
E duvidar