13 de maio de 2014

Poendo o horizonte
O velho e gordo sol
Despenca hilariante
detrás das montanhas

O gato da Alice então
Vem pra o concerto
Das estrelas e ouvindo
Grilos e cigarras vai
Limpando o céu da confusão
Que o desastrado astro deixou
Será que sou só eu
que procuro com o olhar
irrequieto no âmago da noite
A parte de mim que ainda
Não me pertence

Será que apenas mim
Vive assim meio desnorteado
Procurando pelos lados
Um ponto de fuga
Um circo de pulgas
Onde exibir minhas
habilidades caninas

Será que apenas meu olhar
Vagueia erigindo mitos
E metas onde se meta
Minha finalidade e onde
Finde nossa normalidade

Quem sabe aonde leva a noite
Aonde vão os inocentes
Depois que sua inocência
Se torna um empecilho
Para que brilhe o luar

Quero navegar tuas letras
Circundar tuas retas
com o texto das promessas
Que ainda posso fazer

colha o sol com teus seios
sejamos feios apenas
E que nos vejam nus
Esquecidos da civilização

Com a parceria luxuosa e sublime de Eli Macuxi
Se mais vermelha a paixão fora
Qual tora em brasa estalando
Não ficarias no firmamento deambulando
e te consumirias como quem na treva chora

Assim é que talvez não se demora
E alguém mais ajuizado profere misto
de juramento e maldição
Se agora padeces do fogo de Mefisto
É porque de amor ou de tesão
Todo mundo é sem noção

30 de abril de 2014

E La nave vá

crepúsculo palavra que mói o sol
sucessão de coloridos dentes cravados
no ocaso lugar em que ele se perdeu
ao acaso entre o horizonte e o beleléu
ou virou por-do-sol processo de ovular-se
por-se para renascer chocando a manhã
como poente memória que permanece
no sufixo ente como um constante
fim de tarde momento em que tudo
arde e em que Nero faz algum sentido
fazendo de Roma e outros rumos a fogueira
que ilumina o anoitecer no qual e somente
ali o medo assume os mais variados tons

27 de abril de 2014

Eu,
quando não amo,
gamo!
Café com humildade
Preto e pobre
Pão com margarina
Dessas que faz lembrar
Que somos supostamente
Civilizados
E uma manhã cheia de
expectativas gostos e lembranças
De quando eu era mais simples
De quando sabia dos meus pecados

Quando foi que eu saí
da terra do nunca
Refazer os passos
Até repisar a sorte
Equívoco dos que se encontram
Medo dos que nunca se perderam
De nada nem por ninguém

Refazer os passos na areia das ampulhetas
Como se o tempo esse deserto
De esperanças pudesse perdoar
Os incautos de suas velhas dívidas

Refazer os passos com os pés de barro
No barro vermelho do caminho
Até ir virando a poeira cor de sangue
que fecunda e recobre a memória

Poema do desespero existencial

Porque ser
Se você
Pode star
Pernas pra que te quero
Clero das danças e andanças
Pelo país dos desejos
Penas dos beijos que caminham pelo corpo
Sopro de sim que vem com o não
Razão inversa à questão de ser
Ou não ser quando se quer
Colher com a qual se devora
O agora do teu sorriso
gozo das palavras
Escravas que são da nossa paixão
Sensação de mescla e gosto
Posto e aposto no modo de dizer
Querer de andanças infinitas
Aflitas vontades na pista
Passista da minha pele
Ser que me revele em si desconexo
Reflexo de querer andar à tonta
Escolta dos meus muitos eus
Perdidos nos teus devaneios
Seios intumescidos de luares
Lugares em tua tarde onde me escondo
Macondo na solidão do teu caminho
Tantinho de dor que dá prazer
Entender com quantas promessas se faz um ninho
Vinho das bodas de sangue
Gangue de unhas nas costas
Piratas saqueando gemidos
Ouvidos invadidos de blasfêmia
Fêmea do chicote a voz brinca
Finca os dentes derrotando pudícias
Milícias dos dedos patrulhando desvãos
Sãos os pelos se erguem e gritam
Imitam o querer das pernas se desvanescendo
Remendo de núvens para cobrir o sol
Que explodindo se põe
Escavar no outro o paraíso
Indeciso quanto à própria sorte
Depositar-se em maçãs e meias verdades
Fugir em busca da imperfeição dos teus gritos
Tornar-se mortal um pouco de cada vez
Temer a tez desnuda que encarcera
Sucumbir à tortura de ser o algoz
Deixar-se levar à truz unha e boca
à borda da felicidade de precipitar-nos
Entender que todo édem é renovável
À carícias
E se acordasse um belo dia
Descobrisse que não sou o protagonista
Que tudo o que minha vista
Alcança é pouco para que esta ficção
Tenha um mínimo de verosimilhança

E que minha herança é o pó
Das palavras que o vento desuniu

Se percebesse naquele segundo
Que o mundo continua depois
E que era coadjuvante na história
Da pessoa mais insignificante

Onde esconderia meus sonhos
de glória e orgasmos volumosos
Que guardei com carinho

Em que escaninho mesquinho
Seria guardado meu ego
Para jamais ser estudado

Valeria a pena ter pensado
Tanto tanto ter lutado

Não teria sido melhor ser
Ave que morre de pedrada
Esquecida olvidada

Algo que passou
um ser breve
que não vai voltar
Não quer voltar
Não pode voltar

Apenas porque não é preciso
Que nada faça sentido
Nem tenha importância
Para o tempo em que se viveu

Nem mesmo eu
Inominável ronrona serena
Como quem não quer nada
Insinua os bigodes gatunos
E a cabeça coça por dentro

As idéias paradinhas quietas
Organizadas num canto
Proibidas de fazer algazarra
Enquanto algo cicia espanto

Nada de pomposo e grande
Um fiozinho teimoso meio
Pavio meio teia tecida com
O não saber o que fazer de si

Uma quase tontura leve e sem graça
De ser você mesmo e ter que caber
Todo dentro de seu ser anterior
Quando se é infimamente maior

Um estranho apalpando seio
Tentando ver concretamente
O proibido banalizado doente
Necessidade de respostas

Para o não ser
Só esta agonia
A tristeza de crer
E duvidar

15 de março de 2014

Preciso ser menos do que sou
E fazer amigos em cada bar
Preciso dizer que não amo
A mulher das pernas perfeitas
Mas aquela outra improvável
Que entende meu delirio e minha maldição
Preciso escrever na testa que não quero
Nada nem ninguém no meu encalço
E que preciso ser meu de vez em quando
Preciso dizer que ando apaixonado
Por alguém que nem conheço
E que peço aos céus que me desconheça
Também
Preciso estar além
De fato não sei como é a do parto
pois minha condição masculina me impede
Faço uma vaga ideia de como são as cólicas
que dizem ser a segunda maior
depois da concepção
Mas permitam-me discordar
Explicando minha questão

Aquela de perder
a quem se ama
É a pior
Pois não há cura
Não há o que estancar
costurar ou arrancar
Nem o que preencha o vazio
Quando ele dói
quando teu coração pedra for
não duvide da dor que é ser humano
não duvide do engano de uma paixão
não duvide da razão que faz acreditar
não duvide que meu lar foi teu corpo
e que meu sopro de vida foi o mesmo ar
onde teve lugar nosso perfume
o que nos resume a um só e ao mesmo
em que a esmo imagens ficaram marcadas
não faça pouco das fadas cujo encanto
nos retirou o manto e nos fez brincar
a ciranda do par e dos gozos momentâneos
preservada em instantâneos em movimento
alento para os dias de pouca memória
história que virou pó e o vento espalhou
e que se voltou contra nossa vida
e revelou o belo e o triste da relação
por isso quando teu coração pedra virar
procure não hesitar atire o primeiro amor
Em meio aos meus sonhos
Tem aquele em que tua boca
Se adona da minha teu corpo
se ocupa do meu e viver
Se torna tão simples quanto respirar

O problema é esse eterno acordar

redoneto

aprendi com as palavras
a me tornar ligeiramente
divergente do que quero dizer
a me enternecer com o vazio
a sentir frio quando há calor
a bajular o amor mesmo quando
ele esquece de existir

aprendi com as palavras
que estamos todos grávidos
em algum momento
de algo que é do outro
e que não existe repulsa maior
que esquecer o quanto
é singular a primeira pessoa

aprendi com a palavra árvore
a me contorcer por um nada de sol
e a me manter ereto mesmo
nas grandes tempestades

mas no fundo nunca soube
o que as palavras podem
me dizer de igual sem
que haja igualdade
caso com você
Todos os dias que você quiser

E nos que não me aceitar
Me caso com seu lugar
No mundo com seus amigos
Seus dias chuvosos
Com os escravos desses
Seus olhos vadios
Com os navios que sua voz
Naufragou sabendo que
era preciso navegar

Caso com seu (a)mar
me desamando com
a brutalidade do seu carinho
Com seu caminho tão felino
E independente

Caso com seus dias pré
com sua pós suas teses
E te(n)sões

Caso com os senões das nossas discordâncias
E com as errâncias da sua pele
Em mãos estranhas e tempos distintos

Caso com o que meu corpo
não sabe das suas experiências
com as rugas que surgirão

Caso com sua mão
E com a história que ela sonhou
E realizou

16 de fevereiro de 2014

É nas madrugadas que me pertenço mais
É quando vejo a calma subindo e descendo
No peito da pessoa que dorme ao lado
E que teimo em desconhecer embora ame

É nas madrugadas que construo gemendo
meus castelos assombrados por velhos
Casais de príncipes felizes para sempre
E me permito fingir que terei a mesma sorte

É nas madrugadas que odeio sonhar com
outros possíveis amores mais divertidos
Menos responsáveis quase infantis de tão
Diferentes sempre afogados no próprio gozo

É nas madrugadas que sou mais consciente
De que desejo o irreconciliável a paz e a agonia
A tristeza e a alegria o prazer ilimitado orgiástico
De não ter lar medos máscaras ou segredos

É nas madrugadas que reinvento o que sinto
Que possuo a mim e aos meus loucos desejos
Que liberto o poeta dos grilhões da sanidade
E depois amanheço entre o comum e a vontade

13 de fevereiro de 2014

Déjà vu

Já estive aqui antes
Embaixo desta árvore
Olhando teus olhos imóvel
Esperando que a reação
Ao beijo não fosse um tapa

Já fiquei aqui mesmo
Nessa posição quase fetal
Esperando o golpe letal
do teu sorriso que tanto
quis que não fosse espanto

Sim vivi esta mesma cena
Misto de pânico e euforia
Dizendo o que jamais diria
A mais ninguém deste mundo

A história sonha com
A própria historia e nós
Pensamos viver novamente
Aquilo que se vive plenamente
Apenas uma vez

2 de fevereiro de 2014

Perderam os óculos
As bocas míopes de desejo
Mas se acharam caminho
No silencioso b(r)aile das linguas
Vejo teu olhar na face
incômoda da saudade
fico pensando nas mentiras
Que a vida conta sobre
A felicidade e o modo
Sádico como a inventamos

Parece que somos feitos
Da mesquinha ilusão
De que podemos
ser felizes juntos
Mas logo descobrimos
Que nem mesmo a tristeza
É a mesma para todos

Parece que sabemos
Onde vai o olhar distante
Que paira sobre o mar
E a desesperança
Quando o sol se põe

Achamos poesia no sofrer
Achamos poesia no sorrir
no que nos dá temor
e chamamos de amor
À incomunicabilidade
Só porque queremos
Trespassar o outro
Com a nossa solidão

27 de janeiro de 2014

Sobre o amor, disse-me um poeta uma vez
Que ele deve ser infinito enquanto dure
Donde se conclui que quem tem um amor
Deve cuidar para que o tempo não o contamine

Classificados


Procura-se para noivado urgente
Apenas durante o carnaval
Linda mulher pouco exigente
De beleza física e moral

Se tivesse de dizer o que sinto
Sem metáforas e subterfúgios
Diria que estou cansado
Não do cansaço físico e mental
Do trabalho das lutas da correria
Um cansaço insolúvel inseparável
De quem deseja estar entre os vivos
Mas não deseja seguir existindo
Um cansaço euforia
de quem vê na alegria
Um motivo pra se entristecer
Uma forma anômala de expectativa
Uma espera de não saber o quê
Como se tudo pudesse acabar
De uma hora pra outra
Ou continuar existindo indiferente
Mesmo depois de eu ter partido
Uma incapacidade de me fazer entender
Como num grito de pesadelo
Um desejo de ser adivinhado
E de ter alguém igual
pra não precisar dizer palavra
Mas reconheço que nada disso
Diz respeito a ninguém mais além de mim
Por isso sigo vivendo
Entre o triste e o apaixonado
Até quando?

20 de janeiro de 2014

Vontade de não ser eu mesmo
Vontade de ser a esmo
Qualquer um em qualquer lugar
De ter um falar diferente
De amar outra gente
E fazer o que eu não faria
Uma patifaria um maltrato
Vontade de sumir no mato
E não voltar a olhar o espelho
Mas sou meu velho conhecido
Previsível no sentir e em tudo
Não posso arrancar as entranhas
E dizer palavras tamanhas
Num idioma que não conheço
Virar-me do avesso negando sina
E a fina linha que separa sonhos
De insanidade inventando
minha cara metade de um anúncio
Ou de uma placa de propaganda
viver em Uganda ou em Punta Del Este
ser a peste ou a fome num circo de horrores
e até Maria das Dores eu seria
tudo porque cansei de mim neste dia
Lunático sim de não aguentar
A fumaça dos escapamentos
De não tolerar burocracia
E ajuntamentos
De querer correr livre
Pela praia nu
De olhar a molecada pela janela
E de repente achar que tenho quinze
Não dez anos um estilingue
pipa e bolinhas de gude
De querer passar a tarde
inteira grudado nos teus lábios
De todos os tamanhos e razões
De sentir tuas vazões em ondas
De tornar redondas as bordas do mundo
De poder nadar no teu perfume
E me fazer infame de tanta risada
De ter prazer do nada
Até mesmo na televisão histérica
Ligada na sala falando do vazio
Ou de existências tão ocupadas
Em se chatear que se esqueceram de viver
Lunático sim de te querer assim
Feito SP num domingo
A paulista embandeirada
Num protesto pela liberdade de amar
Meio feriado meio loucura
Devotado que te sou
Minha luz minha lua

17 de janeiro de 2014

Num primeiro momento
Apenas sorriam
As bocas penetrando
As pupilas impiedosamente

No instante seguinte
A distância foi eletrificada
E cada novo pensamento
dava choques na pelve
Ou funcionava como um tapa

Ela era toda frios e brios
Ele a faca o queijo e a mão
De tanto desejar
Já não queriam ali estar

Aproximaram aos poucos
A dura expectativa
Da receptiva vontade
E se preparavam já
para as formalidades

Ele em perfume de hormônios
Ela toda liquido em volúpia
- Hola, yo soy tu futuro esposo
- Moi? Je ne te comprend pas

E o desejo perdeu outra vez
Para a burocracia linguística

CONSELHO DE SANTO (QUEM DISSE QUE UM MIBIELLI NUNCA PODERIA SER CANONIZADO????)

Doe amor a cada nova mancada
A cada pancada que levar de outro ente
Doe amor justa ou injustamente
Como quem doa a própria semente

Doe dor aos tambores e gritos
E aos processos infinitos do amar

Doe a carne se preciso for
Ainda que tarde a certeza do amor
E doe as feridas do morder e do sugar
Como quem se dá à fome do olhar

Doe casa aconchego e até a lareira
Doe a arrumadeira e os sapólios
Deixe tudo pronto e arrumado
Só não limpe o aroma do doar

Doe o ar dos seus pulmões
E os pães que se hão de comer
Doe para ser doada em igual medida
Doe para a vida e a pequena morte

Se puder doe a sorte de poder doar
Doe sempre e tudo mesmo a quem não precisa
pois doar só dói pra quem se economiza
O que me dirá essa voz escura
Cujas palavras ressoam na carne
Despregando confidências
Que nem o próprio tempo colheu

Que me dirão seus ecos sem porvir
Sobre as sobrancelhas cerradas
Que o medo ostenta sobriamente
Quando despacha burocráticos beijos

Quem cantará funéreo a altas horas
Pelos quatro costados da solidão
Por certo não é a ave agourenta
Recheada dos gazes aristocraticos de never more

Mas algo muito pior e ainda mais virulento
A poeira do fim o próprio esquecimento
As runas e as renas
São eternas assim como
Os conselhos paternos
Que ronronam graves atrás das eras

Destravado em suas engrenagens
O tempo não é mais o mesmo
Escorre sibilando desvairado
Num vale de insanidades
Amolecido por Dali

Quem me dera meu lar
tivesse umbrais e não
esquadrias de alumínio
E o olhar marmóreo de Athena
Condenasse o plástico
Onde se afoga a maioria
dos sentimentos comprados
A meios cobres num fast food
dançante de subúrbio

Que triste sorte nos alucina
A ponto de querermos curvar
O infinito na relatividade dos shoppings

Nada nos une tudo nos oprime

Quem diabos poderá dizer
Em qual IML desse mundo afora
foi parar o corpo de Lenora
E não sei se foi D. Quixote
Ou outro Pessoa que uma vez
Me disse que para o moinho
Da mente funcionar
É preciso que ali se faça
Farinha de ar