12 de julho de 2010

Adoto um poema

Pode ser branco preto
Mesclado amarelo
Indigenista ou não
Pode não ter cabelo
Pode até ser um apelo
Aos sentimentos mais maternais
Não consigo conceber o verso
Que me arrebenta a garganta
E preciso experimentar
Porque o relógio biológico
Exige que eu tenha
Um poema meu
Dado
Vendido
Contrabandeado
Se for o caso
Não precisa ter rimas azuis
Nem ritmos encaracolados
Pode ser qualquer um
Ter pedras ou vir de paragens distantes
Onde as prostitutas e as palmeiras
São amigas bonitas e andam de bicicleta
Pode ter o olhinho puxado
E ser mirrado
Como um haiku

Adoto um poema
Que precise de pai

4 comentários:

Elimacuxi disse...

ANEDOTA

pai
me dá um abraço?
sóbrio
eu me enlaço
embaraçando ideias e palavras.

pai
me dá um sorriso?
embriagado
eu improviso
um som audível ao teu peito.

pai
me aceita?
receita curas pra essas dores
preces pra essas cores
coros pra esses prantos.

pai
me adota?

Unknown disse...

Adoto e boto
Foto no meu Orkut
Revelando laços
E louças e umas bossas
E fossas do ser intermédio
Não há remédio
Para nosso extravio
Apenas um fio de meada
E um nada envolvente
Que não permite
Que a gente sonhe mal
Não esquente
Apenas pouse a face
No meu tridente
E deixe-se arranhar
Pela paz paternal

Sandálias do Outono disse...

dei meus pais biológicos
para as feras
do pão e circo
o que sobrou
foi pro zoológico

romano
lavei minhas mãos
e depois mijei sobre as fezes
dos leões

adotei dois costumes:
rejeitar a ignorância de papai
me fazer pobre
e lutar contra o conformismo de mamãe
me querer triste!

não sou rico nem alegre
a desfiliação é um longo parto
mas sempre que nasço
tomo partido
e faço festa
para esquecer
a orfandade
dos meus braços

(charles silva)

Unknown disse...

CARACA! Esta página devia entrar pra história da literatura mundial! Tanto o Charles quanto a Eli superaram de longe o poema que instigou o diálogo. Me deliciam em particular "receita curas pra essas dores/ preces pra essas cores/coros pra esses prantos" e "embriagado/ eu improviso/ um som audível ao teu peito" da Eli e ABSOLUTAMENTE toda a crueldade do poema do Charlinho. Ele é denso, é um parto invertido, com todas as dores e com o filho atravessado, do qual se sobrevive apesar do médico e do anestesiologista! É Lindo!