Um dia
ia indo
o mundo
vinha vindo
na direção contrária
e o choque foi inevitável
Não digo que era um dia
para maus humores
ou para rumores e resmungos
Era um dia comum
aprazível e naturalizado
A praça era praça
A flor era flor
O café tinha o mesmo cheiro
do café do dia anterior
Sexo não havia
pelo menos chovendo
não Mas o mundo vinha vindo
inexorável como sempre
indelevelmente inexorável
atropelando atropelados
rasgando virgens
folhas fazendo
com que a caneta
a segura bela e dócil caneta
crescesse e se multiplicasse
em espelhos
memórias
essas histórias descoloridas
Ai notei
a vida tinha virado
um eterno mangá
6 comentários:
E as histórias em quadrinhos já ultrapassaram os 7 bilhões, dos quais, acredito, 3,5 bilhões são revistinhas femininas onde eu gostaria de molhar o dedo e virar a página, que leitura pouca é bobagem! KKK!!!
Sem sacanagem, a imagem do mangá fecha com chave de ouro o poema. Muito boa, mesmo. Sugiro que retires a pontuação.
Charles.
ok, acatado... Obrigado!
Roberto, o poema que mostro a vc quer traduzir a abordagem de um homem a uma mulher num bar que rola um blues. Repare que as duas primeiras rimas são imperfeitas, forçadas, representando o embaraço natural do primeiro contato. Depois, ocorre a rima perfeita, simbolizando o sucesso da abordagem, o encontro das almas, essas coisas. Espero que vc goste.
blues
disseram que você havia
perdido os óculos
ainda bem que o seu gosto
não perdeu o foco
no bar um blues
e tudo que supus veio num beijo
apague a luz
a noite me reduz ao seu desejo
disseram que você havia
pintado uns maios
e que também teria exposto
mais de um cenário
no bar um blues
e tudo que supus veio num beijo
apague a luz
a noite me reduz ao seu desejo
disseram que você havia
feito vexame
e que o vinho bovary você
minha madame
no bar um blues
e tudo que supus veio num beijo
apague a luz
a noite me reduz ao seu desejo
(charles silva)
Miba,
Adorei o poema. Ele de fato "vem vindo", como anuncia a primeira estrofe. Gosto da idéia de manutenção da rotina a partir da terceira estrofe, que traz, ao mesmo tempo, uma dúbia sensação de surpresa, já que tudo continua igual. Falo da surpresa de constatar que "o café tinha o mesmo cheiro do café do dia anterior".
olhando em perspectiva, leio: tudo vira. E ao fim, bem pode ser mangá.
BLUES
Charlinho o seu Blues tá muito bom! Peço desculpas por não ter comentado antes, mas andei meio atarantado e queria lê-lo com gosto e não com a raiva que ando tendo ultimamente. Acho, apenas correndo, um pouco, o risco de ser perfeccionista demais, que ele não é muito "evolutivo" (não no sentido darwinista, é claro), ou seja não garante em quem lê a imagem de uma única aborbdagem. Em mim a impressão foi de serem diferentes sujeitos (3) e/ou modos de abordar, para o mesmo par que age sempre a partir do que "supõe que exista naquele diferente beijo (do próximo/outro sujeito). Não sei se foi uma forma decalcada da imagem que tenho ainda na memória (memória que anda muito ruim ultimamente) de um outro poema seu, muito lindo, que diz num verso "eu, promíscuo, sou mais bonito", mas essa foi a impressão que me ficou. Uma personagem, a primeira, parece intelectual (os óculos), a segunda artista plástica (pintado/exposto), e a terceira, um ser da noite (Mme. Bovary). Talvez seja uma leitura nostálgica, acentuada pela repetição do que parece um refrão (o que me leva a crer na repetição do sujeito, ou seja na promiscuidade) pq isso me lembra a velha floripa de então. De todo modo o poema me encanta muito.
Roberto, obrigado pela leitura. Na verdade esse poema é autobiográfico. Agarrei uma japonesa num bar aqui em Floripa que toca blues nas segundas-feiras. Ela perdeu os óculos nesse bar na noite em que ficamos juntos. E, para completar, ela é casada... Estamos enrolados, por enquanto. Às vezes sonho com um 38 na minha nuca. Mas há um nordestino em mim que sempre acorda e diz: "morro, não!" rs
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